segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A pluralidade de empregadores

Sou gerente de uma empresa que está inserida num grupo económico.
Pretendemos, agora, contratar um trabalhador para exercer a sua atividade em grande parte das empresas do grupo. Isto é válido?

A partilha de capital humano configura uma das soluções mais eficazes na contenção de custos, o que, neste momento, é essencial para a saúde financeira dos grupos empresariais.

Uma das modalidades que esta partilha pode assumir é a contratação de um trabalhador por vários empregadores, para que aquele exerça a sua atividade para todos estes. É aquilo que se denomina contrato de trabalho com uma pluralidade de empregadores.

Este tipo de contrato é, pois, benéfico no que tange à maximização de recursos humanos, porquanto permite que um trabalhador preste, de forma indiferenciada, simultânea ou sucessiva, a sua atividade a favor de várias entidades, numa mesma jornada de trabalho e recebendo uma só retribuição.

De acordo com o disposto no artigo 101.º do Código do Trabalho (CT), um trabalhador pode obrigar-se a prestar trabalho a vários empregadores, entre os quais exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, ou que tenham estruturas organizativas comuns.

As modalidades de coligação empresarial, que fundamentam a contratação de trabalhadores neste regime, aparecem reguladas no Código das Sociedades Comerciais (CSC). Este diploma consagra três formas distintas de grupos societários: os grupos constituídos por contrato de subordinação, por domínio total (art. 493.º e ss. e 488.º e ss. CSC); o grupo paritário (art. 492.º CSC); e, ainda, os grupos fruto de uma relação de participações recíprocas (art. 485.º CSC).

O n.º 2 do referido artigo 101.º CT contém uma enumeração taxativa dos elementos que devem constar do contrato de trabalho com pluralidade de empregadores. Assim, esta norma estabelece que o contrato está sujeito à forma escrita e deve conter:
a)      Identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes;
b)      Indicação da atividade do trabalhador, do local e do período normal de trabalho;
c)      Indicação do empregador que representa os demais no cumprimento dos deveres e no exercício dos direitos emergentes do contrato de trabalho.

Conforme se retira da alínea c) supra, no contrato de trabalho deve indicar-se o empregador representante, isto é, uma entidade que funcionará como elo de ligação entre o trabalhador e os vários empregadores, que deve transmitir àquele as ordens e as instruções a que deve obediência e cuja inobservância o fará incorrer em responsabilidade disciplinar. Para além disso, competirá a este empregador representante o processamento e pagamento da retribuição devida, bem como, entre outras, a obrigação de inscrição do trabalhador na Segurança Social.

Importa referir que a inexistência do documento que titula a prestação de trabalho a vários empregadores, ou a violação dos requisitos acima elencados, provoca a ilicitude da prestação de trabalho a uma pluralidade de empregadores, e, consequentemente, confere ao trabalhador o direito de optar pelo empregador ao qual fica vinculado.

Quanto à execução do contrato de trabalho, note-se que ainda que o trabalho seja, indistintamente, prestado a qualquer uma das entidades empregadoras, o trabalhador apenas deve exercer o número de horas indicado, no contrato de trabalho, como período normal de trabalho. Isto quer dizer que os limites máximos do período normal de trabalho são os mesmos que vigoram para os trabalhadores que prestam o seu trabalho a apenas um empregador, nomeadamente 8 horas por dia e 40 horas por semana.

Por força do disposto no n.º 3 do aludido inciso legal, os empregadores são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de trabalho, cujo credor seja o trabalhador ou terceiro. Tal implica que o trabalhador possa exigir o cumprimento integral dos seus créditos não só ao empregador representante mas a qualquer um dos outros empregadores, tendo o pagamento efetuado, por qualquer um destes, efeito liberatório.

Se, durante a vigência de um contrato de trabalho desta natureza, se extinguir a relação de grupo entre as várias entidades empregadoras, então, considera-se que o trabalhador fica apenas vinculado ao empregador que é indicado no contrato de trabalho como empregador representante. Só assim não será se as partes tiverem acordado o contrário.

Em suma, no caso em apreço, desde que estejam preenchidos os requisitos legais, poderá admitir-se o trabalhador com base num contrato de trabalho com pluralidade de empregadores. Tal mecanismo legal permitirá que qualquer uma das empresas do grupo económico – desde que estejam identificadas no contrato de trabalho – beneficie do trabalho prestado.
Na verdade, o regime da pluralidade de empregadores pode assumir-se como uma alternativa à prestação de trabalho por parte de um trabalhador a uma outra entidade, que não seja ao abrigo da cedência ocasional.

                                                                                                                        Ricardo Meireles Vieira  
                                           Gabinete de Advogados António Vilar, Luís Cameirão & Associados
avlc@avlc-advogados.com
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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Consulta Pública do Projeto de Decreto-Lei que procede à alteração do Decreto-Lei n.º 209/2005, de 29 de novembro, que criou o regime sancionatório aplicável ao Regulamento (CE) n.º 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004

O INAC, I.P. disponibilizou para efeitos de consulta publica, e eventuais comentários, o projeto legislativo que procede à alteração do Decreto-Lei n.º 209/2005, de 29 de novembro, que criou o regime sancionatório aplicável ao Regulamento (CE) n.º 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004, que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos, e que revoga o Regulamento (CEE) n.º 295/91.
O projeto encontra-se disponível para dowload aqui, devendo os eventuais  comentários ser enviados até ao dia 3 de março de 2012, por correio para: INAC, I.P. - Gabinete Jurídico – Rua B, Edifícios 4, 5 e 6 – Aeroporto de Lisboa – 1749-034 Lisboa ou por e-mail para: gabjur@inac.pt.


Manuel J. A. Cunha
Gabinete de Advogados António Vilar, Luís Cameirão & Associados

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Participação nos lucros

Para garantir a continuidade de alguns dos quadros médios da nossa empresa, pretendíamos atribuir-lhes alguns benefícios.
Se possível, estes benefícios devem servir de motivação aos nossos colaboradores para melhorar a produtividade da empresa. O que poderemos fazer?
Existem inúmeros instrumentos legais que podem funcionar como incentivo ao aumento da produtividade dos trabalhadores e, bem assim, como meio de captação dos recursos humanos da empresa.

O mais óbvio é, claramente, o aumento da retribuição auferida pelos colaboradores.
A retribuição é, de acordo com o disposto no art.º 258.º Código do Trabalho (doravante CT), a contrapartida do trabalho realizado. É um elemento do sinalagma contratual, e por isso, fundamento de uma obrigação do empregador (cfr. art.º 127.º n.º 1 al. b) CT).
A retribuição é composta não só pela retribuição base e diuturnidades, como por todas as prestações regulares e periódicas, realizadas de forma direta ou indireta, em dinheiro ou em espécie.
Com a expressão “regular”, o legislador pretende referir-se a uma prestação não arbitrária, que segue uma regra permanente. E exigindo caráter “periódico” para a integração da prestação do empregador na retribuição, o legislador pretende que ela seja paga em períodos certos no tempo. Caso preencham esses requisitos, estes complementos salariais adquirem caráter retributivo. Assim, salvo acordo dos trabalhadores, não pode o empregador deixar de os prestar.
Desta forma, no caso em apreço, podemos optar pelo simples aumento da retribuição dos trabalhadores.

Contudo, para além da retribuição, o empregador pode conceder prestações não retributivas aos trabalhadores, isto é, pagamentos que não se enquadram no conceito de retribuição, por estarem para além do sinalagma contratual. Estes pagamentos constituem liberalidades, logo, o empregador pode, a qualquer momento e de forma unilateral, deixar de os pagar.
No caso em apreço, um instrumento que poderá ser muito eficaz no objetivo de manter os trabalhadores vinculados à empresa e motivados é atribuição de uma participação nos lucros da empresa.
Com efeito, a empresa pode definir regras que premeiem os trabalhadores que mais contribuíram para a produção do lucro, sem que o montante atribuído seja considerado retribuição. São os prémios entregues em função da obtenção do lucro pela empresa.
O Código do Trabalho estabelece, no seu artigo 260.º n.º 1 al. d), que não se considera retribuição “a participação nos lucros da empresa, desde que ao trabalhador esteja assegurada pelo contrato uma retribuição certa, variável ou mista, adequada ao seu trabalho.”
Tratando-se de uma prestação que acresce à retribuição base e que se destina a premiar o trabalhador pelo sua qualidade de trabalho, empenho ou resultado produtivo, a participação nos lucros assemelha-se a uma gratificação, tudo dependendo, para efeito da sua caracterização como componente retributiva, do seu caráter de regularidade.
Na verdade, ao exigirem condições para a sua posse e ao estabelecerem, geralmente, a perda do direito caso os trabalhadores saiam da empresa antes da sua atribuição, a participação nos lucros consubstancia um incentivo eficaz na “retenção” de colaboradores.

Para além disso, a atribuição de uma participação nos lucros tem vantagens ao nível tributário, quando comparada com a atribuição de valores aos trabalhadores a título de remuneração. É que, no que tange a contribuições sociais, se por um lado a al. aa) do n.º 2 do artigo 46.º do Código Contributivo dispõe que são incluídas na base de incidência, e, por isso, sujeitas a contribuições sociais, “as prestações relacionadas com o desempenho obtido pela empresa quando, quer no respetivo título atributivo quer pela sua atribuição regular e permanente, revistam caráter estável, independentemente da variabilidade do seu montante”; por outro lado, por força da alteração introduzida pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, a regulamentação prevista para aplicação desta alínea deverá ser precedida de avaliação efetuada em reunião da Comissão Permanente de Concertação Social que não deverá ocorrer antes de 1 de janeiro de 2014. Ou seja, na prática, a aplicação do disposto na alínea supra indicada ficará adiada até, pelo menos, 01/01/2014.

Em suma, a atribuição aos trabalhadores de uma participação nos lucros poderá ser um meio eficaz para garantir a continuidade dos trabalhadores e, também, para os motivar a melhorar os resultados da empresa.

Ricardo Meireles Vieira
Gabinete de Advogados António Vilar, Luís Cameirão & Associados
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