sexta-feira, 27 de julho de 2012

NOTAS SOBRE SISTEMA FISCAL DE ANGOLA E A DUPLA TRIBUTAÇÃO





A fiscalidade não é um factor, por si só, criador de riqueza, mas pode constituir um custo relevante para os investimentos, quando estão em confronto vários sistemas fiscais. É essencial ter presente as especificidades da fiscalidade angolana e portuguesa, sob pena das vantagens comerciais ficarem prejudicadas pela ocorrência de fenómenos de dupla tributação.


O investimento português em Angola tem de ter em consideração a tributação que ocorre nesse país, em especial, aquela que decorre do imposto industrial e do imposto sobre a aplicação de capitais. Além disso, o investidor deverá tomar em consideração a inexistência de uma convenção para evitar a dupla tributação, bem como, a inexistência de regras sobre a subcapitalização, os preços de transferência e a tributação especial de grupos de sociedades.

Neste contexto, os rendimentos provenientes de fonte angolana estão sujeitos em Angola à taxa geral de 30% (imposto industrial), que poderão ser imputáveis a um estabelecimento estável aí situado. Ainda em sede de tributação de imposto industrial, as empreitadas e outras prestações de serviços estão, respectivamente, nos termos da Lei n.º 7/97, sujeitas retenção na fonte de 3,50% e 5,25%.

Nos termos da revisão do código do imposto sobre a aplicação de capitais, este imposto incide sobre os rendimentos resultantes da aplicação de capitais, que se dividem em duas secções (secção A e B). Na secção A incluem-se os juros dos capitais mutuados e os rendimentos provenientes dos contratos de abertura de crédito, que estão sujeitos a uma taxa de imposto de 15%. Na secção B incluem-se, entre outros, os dividendos, juros de obrigações, juros de suprimentos, royalties, juros de depósito à ordem e a prazo, e quaisquer ganhos decorrentes da alienação de participações sociais, aos quais se aplicam uma taxa de imposto de 10%. No entanto, existem algumas situações em que a taxa de imposto é de 5%, como sejam os juros provenientes de bilhetes e obrigações do tesouro.

O sistema angolano adopta o princípio da territorialidade, o que associado à inexistência de convenção internacional para evitar a dupla tributação, promove fenómenos de rendimentos tributados por mais que um sistema fiscal. Assim, a dupla tributação internacional surge quando situações que têm contacto com mais do que uma ordem jurídica são objecto de tributação pelos diferentes países intervenientes na relação jurídica. Porquanto, estamos perante situações que estão em conexão, num dos seus elementos, com mais que um ordenamento jurídico, não sendo, por isso, situações puramente internas.

Em vários casos, a dupla tributação provoca efeitos negativos em relação às trocas comerciais, bem como, na circulação de capitais, de tecnologias e de pessoas.

Quanto ao poder de tributação, ele ocorre com base em algum elemento de conexão. Essa conexão pode ter uma vertente pessoal ou territorial, ou seja, será baseada na nacionalidade ou no território.

A dupla tributação é um conceito utilizado no direito tributário para designar o fenómeno do concurso de normas, ou seja, quando o mesmo facto se integra na previsão de duas normas diferentes, dando origem à constituição de mais do que uma obrigação de imposto. Por isso, este conceito implica a existência de identidade do facto (do objecto, do sujeito, do período contributivo e do imposto) e da pluralidade de normas. Com efeito, merece especial atenção o problema da identidade de sujeitos, para separar a dupla tributação jurídica da económica. Assim, na dupla tributação jurídica existe identidade do sujeito, ou seja, tributa-se, por diferentes normas, o mesmo sujeito passivo, enquanto que, na dupla tributação económica, ocorre a designada dupla imposição económica ou sobreposição de impostos, que implica que exista identidade quanto ao objecto, mas diversidade quanto aos sujeitos passivos.

Nestes termos, as convenções sobre dupla tributação pretendem eliminar a dupla tributação jurídica e não a dupla tributação económica. Também é costume afirmar que, no caso concreto de Angola, existe no Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) uma norma que promove o mesmo resultado do que estas convenções internacionais. No entanto, tal afirmação não corresponde à realidade, pois, o artigo 42.º do EBF é limitado à questão da dupla tributação económica dos lucros distribuídos e não à dupla tributação jurídica, por isso, tem um campo de aplicação bastante reduzido.

Nos termos desta disposição legal, é aplicável aos lucros distribuídos a entidades residentes por afiliadas residentes em países africanos de língua oficial portuguesa (como Angola), a dedução dos rendimentos, incluídos na base tributável, correspondente aos lucros distribuídos, prevista no artigo 51.º n.º do Código de IRC. No entanto, este benefício está dependente da verificação cumulativa de alguns requisitos. Assim, as entidades envolvidas (beneficiária e distribuidora) devem estar sujeitas e não isentas de IRC ou de imposto sobre o rendimento análogo a este. Depois, a entidade beneficiária tem de deter, de forma directa, uma participação não inferior a 25% do capital da sociedade distribuidora (afiliada), durante um período de 2 anos. Por fim, os lucros distribuídos têm de ter origem em lucros da sociedade distribuidora que tenham sido tributados a uma taxa não inferior a 10%. Os lucros gerados não devem resultar de actividades geradoras de rendimentos passivos, tais como, royalties, mais-valias, outros rendimentos de valores mobiliários e rendimentos de imóveis situados fora do país de residência da sociedade.

Esta disposição legal não resolve a dupla tributação jurídica internacional, como seja, por exemplo, o problema de Portugal tributar com base na residência todos os rendimentos gerados (princípio da tributação mundial dos seus cidadãos) e Angola tributar os rendimentos gerados no seu território (princípio da tributação da fonte).

No caso de Portugal e Angola, apesar das negociações existentes, ainda não foi possível celebrar uma convenção para evitar a dupla tributação internacional, o que pode criar vários problemas aos empresários de ambos os países. A conclusão deste processo é fundamental para potencializar os investimentos noutros países da região africana, bem como, para assegurar a segurança jurídica da situação fiscal dos contribuintes que exercem, ou pretendem exercer, quaisquer actividades comerciais, industriais, financeiras, ou outras, em Angola.

A celebração de acordos sobre a dupla tributação permitirá aumentar e intensificar o desenvolvimento das relações económicas internacionais, possibilitando maior flexibilidade no movimento de capitais e pessoas, nas transferências de tecnologias e circulação de pessoas, bens e serviços. Além disso, a celebração destes acordos impulsionará a entrada em Angola e Portugal de capitais imprescindíveis ao desenvolvimento de ambos os países.

A celebração do dito acordo permitirá, também, uma maior transparência e celeridade nos negócios entre as empresas dos dois países, tal como permitirá a utilização do sistema fiscal como um instrumento de política económica, evitando que os incentivos fiscais sejam anulados pela dupla tributação.

A primeira questão que se coloca ao investidor português, tendo em conta a questão fiscal consiste em determinar se lhe é mais favorável constituir uma sociedade de direito angolano ou se lhe é mais vantajoso actuar através de um estabelecimento estável. Os rendimentos, em ambas as situações, ficam sujeitos a imposto industrial, à taxa de 30 %, mas os lucros de uma sociedade (subsidiária) serão sujeitos a uma retenção na fonte de 10%, enquanto o repatriamento dos excedentes de um estabelecimento estável (sucursal) não está sujeito a tributação. No entanto, há que ter em conta que a concessão de benefícios fiscais será mais fácil no caso de se tratar se uma subsidiária. Além disso, sendo uma sucursal, os seus resultados serão logo incluídos na matéria colectável de IRC, já os lucros de uma subsidiária, em regra, só são objecto de tributação em IRC aquando da sua distribuição aos sócios residentes em Portugal. Adicionalmente, a opção por um sucursal (estabelecimento estável) permite deduzir os seus prejuízos ao imposto devido em Portugal.

Neste âmbito, poderá existir vantagem na utilização de sociedades intermédias, tanto para a tributação dos rendimentos como para um eventual desinvestimento. Essas sociedades podem trazer a vantagem de estarem localizadas em países com isenção de tributação de dividendos e mais-valias, bem como taxas reduzidas de imposto sobre o rendimento, como sucede no Luxemburgo e Holanda. Ora, uma opção bastante viável será a utilização de uma sociedade localizada e licenciada na zona franca da Madeira.

A zona franca da Madeira beneficia de um conjunto de incentivos fiscais para promoção e captação de investimentos. Esses incentivos dirigem-se às sociedades que aí se instalam, aos seus sócios e a determinadas operações objectivamente consideradas.

Actualmente, esta matéria encontra-se regulada nos artigos 33.º e 36.º do EBF. Nos termos do artigo 36.º do EBF, os rendimentos das entidades licenciadas até 31 de Dezembro de 2013 para o exercício de actividades industriais, comerciais, de transportes marítimos e de outros serviços não excluídos, são tributados em IRC, até 31 de Dezembro de 2020, à taxa de 5%, sendo que, em 2012, ainda poderão beneficiar da taxa de 4%.

Para aceder a este benefício, as empresas licenciadas deverão criar de um a cinco postos de trabalho e realizar um investimento mínimo de € 75.000,00 (na aquisição de activos fixos corpóreos ou incorpóreos) nos dois primeiros anos de actividade, ou criar seis ou mais postos de trabalho, nos seis primeiros meses de actividade.

No caso de se tratar de entidades que prossigam actividades industriais, podem, ainda, beneficiar de uma dedução de 50% à colecta IRC, desde que preencham, pelo menos, duas das condições elencadas nas alíneas do n.º 5 do artigo 36.º do EBF.

No entanto, algumas actividades estão excluídas deste regime especial, como sejam as actividades de intermediação financeira, de seguros e das prosseguidas por instituições auxiliares de intermediação financeira e de seguros, bem como, as actividades de tipo “serviços intragrupo”, designadamente, os centros de coordenação, de tesouraria e de distribuição.

Não obstante isso, os rendimentos das sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) licenciadas até 31 de Dezembro de 2013, são tributados às taxas acima elencadas, excepto os obtidos em território nacional.

Finalmente, a utilização de uma sociedade intermédia, com sede na zona franca da Madeira, permite obter vantagens na eliminação da dupla tributação económica dos dividendos distribuídos aos sócios residentes no continente. Ora, a vantagem decorre do facto ser exigida uma menor percentagem da participação social (10%) e um período de detenção também inferior (1 ano), em relação ao previsto no artigo 42.º do EBF.



quinta-feira, 26 de julho de 2012

RESPONSABILIDADE DOS GERENTES


 Sou gerente de uma sociedade e sinto uma grande pressão sobre mim pois sei que os meus actos envolvem muita responsabilidade e tenho receio, precisamente, de poder ser responsabilizado pelos credores da sociedade e pelos trabalhadores pelas decisões tomadas. Como me poderei proteger?






 Antes de mais convém esclarecer que nas sociedades por quotas os gerentes devem praticar todos os actos convenientes ou necessários para a realização do objecto social mas com respeito pelas deliberações dos sócios. Assim, em princípio, os gerentes actuarão de acordo com o que for deliberado pelos sócios, pelo que, o poder decisório não lhes será, em primeira linha, imputado.

Contudo, todos os gerentes estão adstritos a um dever de cuidado e devem empregar a diligência que é exigível, neste âmbito, a um gestor criterioso e ordenado.

Devem, além disso, observar um dever de lealdade para com os interesses da sociedade, atendendo aos interesses a longo prazo dos sócios e ponderando todos os interesses dos demais sujeitos que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade, e, ainda, dos trabalhadores, credores e clientes.

Posto isso, a lei responsabiliza os gerentes pelos danos causados por todos os actos por eles praticados com preterição dos seus deveres legais ou contratuais, salvo se provarem que agiram sem culpa. A responsabilidade poderá até ser excluída no caso de os gerentes provarem que actuaram em termos informados, livres de quaisquer interesses pessoais e de acordo com critérios de racionalidade empresarial.

Também não serão responsabilizados pelos danos que sejam resultantes de uma deliberação colegial na qual hajam votado vencidos ou que nela não tenham participado.
A lei também exclui a responsabilidade dos gerentes quando o acto ou omissão causador de danos à sociedade resulte de deliberação dos sócios.

Para além de responderem perante a sociedade pelos danos a esta causados pelos actos ou omissões por si praticados, os gerentes respondem, ainda, perante os credores da sociedade sempre que, pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção destes credores, o património da sociedade se torne insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos.

Finalmente, os órgãos de administração de uma sociedade respondem perante os sócios e perante terceiros pelos danos que directamente lhes causem no exercício das suas funções.

Conclui-se, assim, que, apesar de os gerentes poderem, de facto, ser responsabilizados no decurso do exercício das suas funções, é necessário que a sua actuação tenha sido culposa e que, por via disso, se tenham provocado danos na esfera jurídica da sociedade, dos sócios, dos trabalhadores, credores e demais terceiros.

Se os gerentes tiverem actuado sem culpa, de acordo com critérios de racionalidade empresarial ou mesmo no âmbito de uma deliberação colegial mas na qual hajam votado vencidos, a sua responsabilidade poderá ser afastada. O mesmo se verifica quando a sua actuação se ficar a dever a uma deliberação dos sócios, visto que, neste caso, a responsabilidade será imputada aos sócios e não aos gerentes.

Deste modo, deverá o consulente, tão-só, agir de forma diligente e criteriosa no exercício das suas funções de gerência e votar vencido, se as deliberações forem colegiais (ou seja, se houver uma gerência plural) e tiver dúvidas quanto à legalidade do acto a praticar.

terça-feira, 24 de julho de 2012

VALOR ADUANEIRO DAS MERCADORIAS IMPORTADAS


Somos uma empresa portuguesa que importa, regularmente, bens produzidos por um fornecedor estrangeiro. Para a importação desses produtos existe um acordo de licenciamento, que nos obriga a pagar uma percentagem que incide sobre o preço de venda dos bens. Tal percentagem é tida em conta para o cálculo do valor aduaneiro das mercadorias?






O caso apresentado pela consulente tem a ver com o Direito Aduaneiro Comunitário, designadamente quanto ao valor aduaneiro das mercadorias. Ora, nos termos do artigo 29.º do Código Aduaneiro Comunitário (CAC) “o valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transaccional, isto é, o preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da Comunidade, eventualmente, após ajustamento efectuado nos termos dos artigos 32.º e 33.º (…)”. Para este efeito, o referido artigo 32.º do CAC, prevê que devem ser adicionados ao preço “os direito de exploração e os direitos de licenciamento relativos às mercadorias a avaliar, que o comprador é obrigado a pagar (…), na medida que estes direitos de exploração e direitos de licença não tenham sido incluídos no preço efectivamente pago ou a pagar”. No entanto, o n.º 5 do artigo 32.º do CAC exclui as despesas relativas ao direito de reproduzir as mercadorias, bem como, os pagamentos efectuados como contrapartida do direito de distribuir ou de revender as mercadorias, se estes não forem uma condição da venda das mercadorias para a sua exportação com destino à Comunidade. Assim, os direitos de licenciamento que a consulente está obrigada a pagar devem ser tidos em consideração no cálculo do valor aduaneiro das mercadorias, desde que não se incluam nas referidas excepções.

O artigo 157.º das Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário (DAC), desenvolve a questão relativa à correcção do preço pago ou a pagar pelas mercadorias importadas, quando estão em causa direitos de exploração ou direitos de licença. Nesse âmbito, o n.º 2 da referida disposição legal, estabelece que a correcção só é devida quando o valor aduaneiro da mercadoria for determinado pelo método do valor transaccionável, e se os direitos estiverem relacionados com a mercadoria a avaliar e se o pagamento constituir uma condição de venda dessa mercadoria. Tais requisitos, no caso em apreço, parecem ocorrer, pelo que os direitos de licença deverão ser acrescentados ao preço efectivamente pago ou a pagar.

No entanto, convém ter presente que o montante dos direitos de exploração ou dos direitos de licença não serão conhecidos no momento da importação por estarem dependentes da ocorrência de um facto futuro (venda dos produtos). Assim, devem as autoridades aduaneiras, em concertação com a consulente, aceitar que a determinação definitiva do valor aduaneiro seja diferida para momento posterior, devendo-se, para tal, nos termos do artigo 257.º do DAC, utilizar o procedimento de declaração incompleta

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A PROTECÇÃO AO TRABALHADOR-ESTUDANTE

Num dos estabelecimentos da empresa de que sou gerente, temos um trabalhador que se inscreveu num curso de mestrado. Porque a empresa tem uma política de valorização pessoal dos colaboradores, pretendemos garantir, àquele trabalhador, todos os direitos que este novo estatuto lhe fornece. Assim, grosso modo e no que concerne ao trabalhador em causa, o que devemos fazer daqui em diante?





A formação profissional dos colaboradores é um objectivo pelo qual todas as empresas devem pugnar. Isto porque, com toda a certeza, o know-how trazido por esses colaboradores, levará a que a eficiência da empresa aumente.

De acordo com o artigo 89.º do Código do Trabalho (doravante CT), considera-se trabalhador-estudante o trabalhador que frequente qualquer nível de educação escolar, nomeadamente mestrado ou doutoramento em instituição de ensino.

O estatuto de trabalhador-estudante confere vários direitos ao trabalhador, que visam permitir uma boa conciliação entre o trabalho e o estudo, propiciando melhores condições de estudo e, desta forma, um aumento das hipóteses de aproveitamento escolar. Na verdade, o aproveitamento escolar é o leitmotiv de todo o regime previsto no Código do Trabalho para o trabalhador-estudante. Desde logo, porquanto a manutenção do estatuto de trabalhador-estudante depende de aproveitamento escolar no ano lectivo anterior. Para os efeitos previstos no Código do Trabalho, considera-se aproveitamento escolar a transição de ano ou a aprovação ou progressão em, pelo menos, metade das disciplinas (ou módulo de ensino) em que o trabalhador esteja matriculado.

Para que lhe seja aplicável o estatuto de trabalhador-estudante, o trabalhador deve comprovar perante o empregador a sua condição de estudante, entregando não só os documentos pertinentes para o efeito como, também, o horário das actividades educativas a frequentar. Porquanto, o horário de trabalho de trabalhador-estudante deve, sempre que possível, ser ajustado do modo a permitir a frequência das aulas e a deslocação para o estabelecimento de ensino. Acresce o n.º 2 do artigo 90.º CT que, quando não seja possível ajustar o horário de trabalho às obrigações educativas do trabalhador, este tem direito a dispensa de trabalho para frequência de aulas, se assim o exigir o horário escolar. Esta dispensa não implica a perda de direitos e conta como prestação efectiva de trabalho.

Contudo, importa alertar que, de entre as possibilidades existentes, compete ao trabalhador-estudante a escolha do horário de trabalho mais compatível com as suas obrigações laborais, sob pena de não beneficiar dos inerentes direitos.

Enquanto estiver a usufruir do estatuto de trabalhador-estudante, o trabalhador não é obrigado a prestar trabalho suplementar, excepto por motivo de força maior, nem trabalho em regime de adaptabilidade, banco de horas ou horário concentrado quando o mesmo coincida com o horário escolar ou com prova de avaliação. Se, ainda assim, o trabalhador exercer trabalho num dos preditos regimes, deve-lhe ser assegurado um dia por mês de dispensa, sem perda de direitos, contando como prestação efectiva de trabalho.

Outro dos direitos que o estatuto de trabalhador-estudante confere é o de faltar justificadamente por motivo de prestação de prova de avaliação. De facto, o trabalhador pode faltar ao trabalho no dia da prova e no imediatamente anterior, desde que as faltas não excedam quatro dias por disciplina em cada ano lectivo. Qualquer exame, escrito ou oral, ou apresentação de trabalho será considerado como prova de avaliação, desde que determine, directa ou indirectamente, o aproveitamento escolar do trabalhador.

O trabalhador-estudante tem, ainda, direito a marcar o período de férias de acordo com as suas necessidades escolares, podendo gozar até 15 dias de férias interpoladas, desde que tal seja compatível com as exigências imperiosas do funcionamento da empresa.

Para além disso, o trabalhador que goze do estatuto de estudante, tem direito, em cada ano civil, a licença sem retribuição, com a duração de 10 dias úteis seguidos ou interpolados. Se o trabalhador pretender esta licença, deve solicitá-la ao empregador com a antecedência mínima de 48 horas, se a duração desta for de um dia, com 8 dias no caso da licença durar entre 2 a 5 dias, ou com 15 de antecedência se a licença durar mais de 5 dias.

No final de cada ano lectivo, o trabalhador-estudante deve comprovar o respectivo aproveitamento escolar. O direito a horário de trabalho ajustado, a marcação do período de férias de acordo com as necessidades escolares ou a licença sem retribuição cessa quando o trabalhador-estudante não tenha aproveitamento no ano em que beneficie desse direito.

Por fim, as horas de dispensa de trabalho para frequência de aulas e de faltas para prestação de provas de avaliação, ao abrigo do regime de trabalhador-estudante, contam para o cômputo de 35 horas de formação profissional a que todos os trabalhadores da empresa têm direito.

Em suma, o trabalhador que irá ingressar no curso de mestrado passará, desde que o solicite, a estar abrangido pelo regime de trabalhador-estudante. Assim, compete à empresa garantir que os direitos acima mencionados lhe são proporcionados, para, desta forma, estarem reunidas as condições de trabalho imprescindíveis à obtenção do aproveitamento escolar.





terça-feira, 17 de julho de 2012

ENTREGA DA CASA SALDA DÍVIDA AO BANCO


A sentença do Tribunal de Portalegre que, aparentemente, estabelece que a entrega da casa ao Banco, em dação em pagamento, é, por si só, suficiente para saldar a dívida, causou um enorme alvoroço nacional, sobretudo nos meios de comunicação.






Contudo, torna-se necessário analisar devidamente esta sentença, para perceber o porquê de tal decisão, porquanto a mesma não é tão linear quanto a descrevem, mas que, ainda assim, se constitui como um marco jurídico no que respeita ao incumprimento do crédito à habitação.

No caso em apreço, o Banco concedeu um empréstimo no valor de € 117.500,00 para aquisição de habitação avaliada, à data da concessão, no mesmo valor, tendo sido constituída hipoteca sobre o imóvel em questão. Os mutuários, em processo de divórcio, aceitaram a existência daquela dívida que, à data do inventário, se cifrava em € 129.521,00 (capital acrescido de juros moratórios e, possivelmente, remuneratórios).

Não tendo liquidez imediata para saldar a dívida ao Banco, foi ordenada pelo Tribunal a venda do imóvel, adquirido com aquele mútuo, pelo valor base de € 117.500,00, não se aceitando propostas de valor inferior a 70% daquele, ou seja, € 82.250,00. O Banco, na venda mediante propostas em carta fechada, veio requerer a adjudicação do imóvel pelo valor mínimo legal, ou seja, € 82.250,00. Após o que, subtraindo o valor da compra do imóvel à dívida existente, veio declarar que a dívida ascendia, agora, a € 47.271,00.

Ora, o Tribunal não reconheceu aquele montante como o valor em dívida. Isto porque entende que, se o Banco mutuou a quantia de € 117.500,00 e não se opôs a que, aquando da venda do imóvel, aquele fosse tido como o valor base de venda, tal conformou o dever de prestar dos inventariados. Ou seja, apesar de não poder deixar de concordar que o valor patrimonial não se identifica com o valor real do bem, entende que aquele limita o valor do incumprimento. Pelo que o montante que permaneceria em dívida seria o diferencial entre o valor que foi reconhecido ao Banco (€ 129.521,00) e o valor do bem que esteve na base do negócio (€ 117.500,00), isto é, € 12.021,00 e não € 47.271,00. Caso contrário, entendeu o Tribunal que estaríamos perante um enriquecimento injustificado da instituição financeira.

Atente-se, contudo, na estipulação que se faz na sentença em análise, onde se reconhece que não há razão atendível para que a adjudicação do bem acarrete, por si só, a extinção da obrigação por completo. O valor do bem, que esteve na base da concessão do empréstimo, é que passa a balizar o incumprimento, independentemente do valor pelo qual aquele venha a ser adquirido pela instituição de crédito. O mesmo, contudo, não é dizer que a entrega da casa ao Banco salda a dívida na tua totalidade, até porque os devedores tiveram que liquidar os juros que acresceram ao capital mutuado.

Esta continua, no entanto, a ser uma decisão pioneira e inédita no direito português, ao contrário do que vem acontecendo no país vizinho, onde as sentenças semelhantes são mais abundantes e onde são os Bancos a assumir o risco imobiliário.

Nesta senda, o Bloco de Esquerda apresentou um projeto de lei no Parlamento para garantir que a entrega do imóvel ao Banco, por força do incumprimento do crédito à habitação, liquida a totalidade do empréstimo contraído para sua a aquisição. Tal proposta encontra-se a ser discutida na especialidade, desde o dia 22 de Março, pela Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças.

De acordo com os dados divulgados pela APEMIP – Associação dos profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária em Portugal, no primeiro trimestre de 2012 foram entregues aos Bancos 2300 imóveis, o que constitui um aumento de 74% face ao período homólogo em 2011.

Se Portugal adotar esta medida, por um lado poderá ajudar as famílias com dificuldades em cumprir com os seus créditos à habitação, mas por outro poderá por em causa a solvabilidade dos Bancos ou contribuir para spreads muito mais elevados na concessão deste tipo de crédito. 

sexta-feira, 13 de julho de 2012

QUESTÃO DE DIREITO CONCORRENCIAL



Sinto que a manutenção da minha atividade empresarial pode estar em risco pelos preços praticados por outra empresa do mesmo ramo, que a meu ver são abaixo do custo de produção. Haverá algo que possa fazer?



O caso em apreço remeto-nos para questões de direito concorrencial, deveras pertinentes e actuais, uma vez que o novo regime jurídico da concorrência (aprovado pela Lei n.º 19/2012, de 8 de Maio) entrou em vigor no dia 07 de Julho do presente ano. Este novo regime é uma imposição do memorando de entendimento assinado com a “troika”, que prevê um reforço dos poderes da Autoridade da Concorrência.

Deste modo, o que pode estar em causa a prática de preços anticoncorrenciais por parte da empresa sua concorrente, que talvez por deter uma posição dominante no mercado os consiga praticar.

Certas empresas dominantes, muitas das vezes - apenas por estratégia mercantil – suportam as perdas inerentes à venda abaixo custo de produção, com a única intenção de diminuírem as empresas concorrentes, por não conseguirem competir de igual forma.

Diz-se que as empresas encontram-se em posição dominante quando têm possibilidade de adoptar comportamentos independentes, que lhes permite agir sem ter em atenção os concorrentes, os clientes ou os fornecedores. Tal sucede quando, devido à sua quota de mercado, ou desta em combinação, nomeadamente, com a posse de conhecimentos técnicos, matérias - primas ou capitais, dispõem da possibilidade de determinar os preços ou controlar a produção ou a distribuição para uma parte significativa dos produtos em causa. Na Europa, não é ilícito uma empresa deter uma posição dominante, assim, só se considera ilícito, o abuso da mesma.

O abuso de posição dominante integra-se nas práticas anticoncorrenciais do mercado. Considerando-se práticas anticoncorrenciais, qualquer tipo de comportamento por operador ou conjunto de operadores que tenha em vista a obtenção e exploração, singular ou colectiva, do poder de mercado, ou seja, o poder de manter o preço dos seus produtos acima do preço que seria praticado num mercado competitivo. No caso que me indicou, podemos estar perante uma situação de um abuso de posição dominante, pela prática de preços predatórios.

Assim, para falarmos de abuso de posição dominante, teremos de analisar o disposto no artigo 102.º do TFUE. Este proíbe o abuso de posição dominante, singular ou colectiva, numa parte significativa ou na totalidade do mercado comum, na medida em que afete o comércio entre os Estados – Membros.
Não é oferecida uma definição de abuso, recorrendo-se apenas a uma combinação da proibição sob forma de cláusula geral seguida de uma tipologia exemplificativa. De acordo com esta ultima, as práticas abusivas podem consistir em:
a) Impor, de forma directa ou indirecta, preços de compra ou de venda ou outras condições de transacção não equitativas
b) Limitar a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores
c) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência
d) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objecto desses contactos.

Concluímos assim, que a prática de preços predatórios poderá consubstanciar um abuso de posição dominante (sendo que o problema dos preços predatórios depende da existência de um referencial de preço, pode ser encontrado no custo marginal ou no custo médio variável. Diríamos então que o preço predatório estaria abaixo desse referencial, ou seja abaixo do preço de custo de mercado).

O mecanismo a adoptar para reagir a esta situação é dar conhecimento à Autoridade da Concorrência que, para o efeito, dispõe de poderes sancionatórios, de supervisão e de regulamentação.


quarta-feira, 11 de julho de 2012

A ACUMULAÇÃO DE UM TRABALHO COM O SUBSÍDIO DE DESEMPREGO



Tenho direito a beneficiar do subsídio de desemprego durante mais 12 meses. Nesta semana, recebi uma proposta de emprego interessante mas que, financeiramente, não é superior ao valor que recebo pela prestação de desemprego. Há alguma forma de acumular o subsídio de desemprego com o trabalho?




A proteção do trabalhador entre empregos deve, cada vez mais, ser uma obrigação do Estado. Com efeito, a promoção da reinserção dos trabalhadores sem emprego no mercado laboral deve ser encarada como uma prioridade.

Nesse sentido, foi publicada, no dia 6 de julho, a Portaria n.º 207/2012 (doravante Portaria), que regula a Medida de Incentivo à Aceitação de Ofertas de Emprego (doravante Medida). Esta consiste numa medida de emprego que promove o regresso ao mercado de trabalho de desempregados subsidiados, através da atribuição de um incentivo financeiro àqueles que aceitem um emprego a tempo completo com uma remuneração inferior ao valor da prestação de desemprego que se encontram a receber.

O Governo pretende, com esta Medida, um “melhor ajustamento no mercado de trabalho, reduzindo o número de ofertas não preenchidas que coexistem com um elevado nível de desemprego”

De acordo com o artigo 1.º da Portaria, esta Medida é aplicável aos beneficiários do regime geral de segurança social, que sejam titulares de prestações de desemprego e reúnam (cumulativamente) as seguintes condições:

a)    Estejam inscritos nos centros de Emprego há mais de seis meses;
b)    Aceitem oferta de emprego apresentada pelo centro de emprego, cuja retribuição ilíquida seja inferior à prestação de desemprego;
c)    Tenham, na data de celebração do contrato de trabalho, direito a beneficiar da prestação de desemprego por um período remanescente igual ou superior a seis meses.


Conforme estipula o artigo 4.º da Portaria, o apoio financeiro concedido por esta Medida consiste na atribuição de um montante pecuniário mensal igual a:
a)    50% do valor da prestação de desemprego durante os primeiros seis meses, até ao limite máximo de € 500;
b)    25% do valor da prestação de desemprego durante os seis meses seguintes, até ao limite máximo de € 250.

O apoio financeiro pode ser atribuído até 12 meses durante cada período de concessão da prestação de desemprego, incluindo neste o período de concessão do subsídio social de desemprego subsequente.

Nos casos em que o contrato de trabalho tenha uma duração inferior a 12 meses, o trabalhador poderá celebrar um novo contrato de trabalho ao abrigo da Medida, desde que continue a ter direito a prestações de desemprego, ainda que por período inferior a 6 meses.

À semelhança do que sucede no caso do trabalhador gozar licença de parentalidade, se durante o período de aplicação da medida, o trabalhador estiver impossibilitado, por doença, de prestar a sua atividade, o pagamento do apoio financeiro previsto na Medida é suspenso. Note-se, contudo, que o montante do apoio financeiro recebido pelo trabalhador em acumulação com o pagamento dos subsídios de doença ou parentalidade é deduzido do remanescente do apoio a que o trabalhador tenha direito.

O apoio financeiro em acumulação com trabalho deve ser requerido pelo beneficiário junto do Instituto de Emprego e Formação Profissional, IP, no prazo de 30 dias consecutivos, a contar da data do início da vigência do contrato de trabalho. Este requerimento tem de ser instruído com a apresentação do contrato de trabalho, que deve incluir, entre outras, a data de início de vigência, retribuição mensal, bem como uma declaração da entidade empregadora a atestar que não beneficia de outros apoios para o mesmo posto de trabalho (designadamente a “Medida Estímulo 2012” ou a dispensa temporária do pagamento de contribuições).

Em suma, desde que preencha os requisitos previstos na Portaria n.º 207/2012, de 6 de julho, nada obsta a que o trabalhador acumule as prestações de desemprego que aufere com os rendimentos do trabalho que lhe foi proposto. Até porque a acumulação destes montantes poderá facilitar a sua reinserção no mercado de trabalho.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Processo Especial de Revitalização (Análise da Lei nº 16/2012, de 20 de abril)




Com as alterações introduzidas ao Código da Insolvência e Recuperação de Empresas pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, o mesmo passou a prever um novo Processo Especial de Revitalização de Empresas.
Objetivo:
Este processo visa promover a recuperação das empresas em detrimento da liquidação do património, sendo esta última, recentemente, a solução mais adotada nos processos de insolvência.
Destina-se a permitir ao devedor que se encontre em situação económica difícil, sendo esta a “dificuldade séria para cumprir pontualmente as suas obrigações” (artigo 17.º-B), designadamente, por ter falta de liquidez ou não conseguir crédito, estabelecer negociações com os credores com vista à obtenção de um acordo conducente à sua revitalização (artigo 17.º-A).
Tramitação:
Inicia-se pela manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, de encetarem negociações tendentes à revitalização daquele, por meio de declaração escrita, assinada por todos os declarante. Esta declaração, acompanhada dos mesmos documentos que deveriam ser juntos com a petição inicial, terá que ser remetida ao juiz com competência para declarar a insolvência que, de imediato, nomeia um administrador judicial provisório (AJP) – artigo 17.º-C.

 Posteriormente, o devedor comunica, por carta registada, a todos os credores que não subscreveram a referida declaração, que deu início a negociações com vista à sua revitalização, convidando-os a participar (n.º. 1 do artigo 17.º-D).

No prazo de 20 dias, contados da publicação no portal Citius do despacho que nomear o AJP, devem os credores reclamar os seus créditos. As reclamações são remetidas ao AJP, por correio eletrónico ou via postal, cabendo-lhe a elaboração de uma lista de provisória de créditos no prazo de 5 dias. A lista provisória é entregue na secretaria e publicada do portal Citius, podendo ser impugnada no prazo de 5 dias úteis e dispondo o juiz de prazo idêntico para decidir sobre as impugnações apresentadas. Se a lista provisória não for impugnada, converte-se em definitiva (n.º 2, 3 e 4 do artigo 17.º-D).

  
Negociação com os credores:

Findo o prazo das impugnações, os declarantes dispõem de um prazo de 2 meses, prorrogável uma só vez por 1 mês mediante acordo escrito entre o AJP e o devedor, para concluir as negociações. Os credores que pretendam participar nas negociações em curso devem comunicar tal facto ao devedor por carta registada, podendo fazê-lo a todo o tempo (n.º 5 e 7 do artigo 17.º-D).

Concluindo-se as negociações com a aprovação unânime do plano de recuperação, em que intervenham todos os seus credores, aquele é remetido ao juiz para homologação ou recusa. Quando não tenham intervindo todos os credores, o plano é remetido ao tribunal e seguem-se as regras relativas à aprovação de um plano de insolvência, nomeadamente, quando ao quórum necessário para a aprovação (n.º 1 a 4 do artigo 17.º-F e artigos 211.º e 212.º).

 O juiz decide se homologa ou recusa o plano no prazo de 10 dias e a sua decisão vincula todos os credores, incluindo aqueles que não hajam participado nas negociações (n.º 5 e 6 do artigo 17.º-F).

 Caso se conclua, antecipadamente, não ser possível alcançar um acordo ou caso seja ultrapassado o prazo para esse efeito, o processo negocial é encerrado e o AJP deve comunicar tal facto ao tribunal e publicá-lo no portal Citius (n.º 1 do artigo 17.º-G).

Se o devedor ainda não se encontrar em situação de insolvência, o encerramento do processo acarreta a extinção de todos os seus efeitos. Se o devedor já se encontrar em situação de insolvência, o encerramento acarreta a insolvência do devedor, devendo a mesma ser declarada no prazo de 3 dias úteis. Se já houver lista definitiva de créditos, o prazo de reclamação destina-se apenas àqueles créditos ainda não reclamados (n.º 2, 3 e 7 do artigo 17.º-G).

O devedor pode terminar as negociações a todo o tempo, sem justificação, devendo apenas comunicar tal pretensão ao AJP, aos credores e ao tribunal por carta registada. Contudo, fica impedido de recorrer a este processo de revitalização pelo prazo de dois anos (n.º 5 e 6 do artigo 17.º-G).

 
Efeitos:

Durante as negociações consagra-se um período de “Stand still”, ou seja, o processo de revitalização obsta à instauração de ações para cobrança de dívidas, suspendendo-se as ações já em curso e extinguindo-se estas logo que seja aprovado e homologado o plano de recuperação.

 O devedor fica, ainda, impedido de praticar atos de especial relevo, sem que previamente obtenha autorização do AJP. A autorização é requerida por escrito e se o AJP não responder no prazo de 5 dias, tal corresponde a declaração de recusa (artigo 17.º-E).




sexta-feira, 6 de julho de 2012

O (NOVO) DESPEDIMENTO POR INADAPTAÇÃO - Artigo publicado na VIDA ECONÓMICA, na rubrica "Consultório Laboral", em 06.07.2012




 Na empresa temos um colaborador que, não obstante as inúmeras formações e “chamadas de atenção”, continua a não executar corretamente o seu trabalho. Isto traduz-se numa diferença de produtividade muito grande em relação aos demais trabalhadores que exercem as mesmas funções.

Existe alguma forma de podermos despedir este trabalhador que claramente não é produtivo?

1. Foi publicada, no passado dia 25 de junho, a Lei n.º 23/2012 que procede à terceira alteração ao Código do Trabalho (CT). Esta revisão ao código laboral entrará em vigor no próximo dia 01 de agosto e promove profundas alterações ao conteúdo do Código, em especial no capítulo da cessação do contrato de trabalho, e, mais concretamente, nos fundamentos e requisitos dos despedimentos objetivos.

De facto, uma das principais alterações no âmbito destes despedimentos é a nova configuração do despedimento por inadaptação que, a partir da entrada em vigor da lei, poderá ser utilizado ainda que não tenham sido introduzidas modificações no posto de trabalho - cfr. art. 275.º n.º 2 CT.

2. Recorde-se que, segundo o n.º 1 do artigo 374º CT, a inadaptação verifica-se nas situações a seguir referenciadas, quando, sendo determinadas pelo modo de exercício de funções de um trabalhador, tornem praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho:

a)      Redução continuada de produtividade ou de qualidade;

b)      Avarias repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho;

c)      Riscos para a segurança e saúde do próprio, dos restantes trabalhadores ou de terceiros.

Atualmente, os (inúmeros) requisitos que a lei impõe para a concretização da cessação por este meio tiram grande parte da efetividade da figura, que praticamente não é utilizada. Isto porque, antes da revisão operada pela Lei n.º 23/2012, a cessação do contrato motivada por inadaptação do trabalhador praticamente só podia ter lugar se estivessem preenchidos, cumulativamente e entre outros, os seguintes requisitos:

i)     Tenham sido introduzidas modificações no posto de trabalho resultantes de alterações nos processos de fabrico ou de comercialização, da introdução de novas tecnologias ou equipamentos baseados em diferentes ou mais complexa tecnologia, nos seis meses anteriores ao início do procedimento;

ii)   Não exista na empresa outro posto de trabalho disponível e compatível com a qualificação profissional do trabalhador;

iii) A situação de inadaptação não decorra da falta de condições de segurança, higiene e saúde no trabalho imputável ao empregador;

iv) Seja posta à disposição do trabalhador a compensação devida.

3.       Com a entrada em vigor do diploma legal que revê o Código do Trabalho, este panorama irá alterar-se. É que, a partir de agosto, o despedimento por inadaptação poderá ter lugar, mesmo que não tenham sido introduzidas modificações no posto de trabalho, desde que:

a)   Tenha havido uma modificação substancial da prestação realizada pelo trabalhador, de que resultem, nomeadamente, a redução continuada de produtividade ou de qualidade, avarias repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho ou riscos para a segurança e saúde do trabalhador, de outros trabalhadores ou de terceiros, determinados pelo modo do exercício das funções e que, em face das circunstâncias, seja razoável prever que tenham caráter definitivo;

b)   O empregador informe o trabalhador, juntando cópia dos documentos relevantes, da apreciação da atividade antes prestada, com descrição circunstanciada dos factos, demonstrativa de modificação substancial da prestação, bem como de que se pode pronunciar por escrito sobre os referidos elementos em prazo não inferior a cinco dias úteis;


Após a resposta do trabalhador, ou decorrido o prazo para o efeito, o empregador deve comunicar ao trabalhador, por escrito, ordens e instruções adequadas, respeitantes à execução do trabalho, com o intuito de a corrigir, tendo presentes os factos invocados por aquele.

Note-se, contudo, que para se proceder ao despedimento de uma forma lícita é, ainda, essencial que o empregador comprove que ao trabalhador foi ministrada formação profissional adequada às modificações do posto de trabalho e que lhe foi facultado, após a formação, um período não inferior a trinta dias de adaptação no posto de trabalho.

Assim, no caso em apreço, será necessário aferir se os requisitos para o despedimento por inadaptação estão preenchidos, nomeadamente se houve uma alteração substancial da prestação realizada pelo trabalhador da qual resulta uma redução da produtividade ou qualidade do seu trabalho. Caso estejam reunidas as condições, a empresa poderá proceder ao despedimento do colaborador.


ESTA SEMANA NA EDIÇÃO N.º1452 DO JORNAL SEMANAL "VIDA ECONÓMICA" LEIA O ARTIGO DE OPINÃO DO DR. RICARDO MEIRELES VIEIRA (P.14) SOBRE :"O (NOVO) DESPEDIMENTO POR INADAPTAÇÃO"...

quinta-feira, 5 de julho de 2012

INVESTIR EM ÁFRICA, uma solução para a crise



No contexto actual de estagnação dos mercados tradicionais utilizados pelas empresas portuguesas, designadamente o mercado europeu, uma das alternativas passa pelo investimento nos mercados africanos. Na realidade, o continente africano apesar de ser olhado com alguma desconfiança, possui uma localização geográfica estratégica, pois, faz a ligação entre os continentes europeu e asiático, podendo funcionar como uma verdadeira base logística e entreposto comercial.

A importância da região está à vista, quando verificamos que o investimento directo estrangeiro da última década aumentou seis vezes e, que países como a China, Rússia, Brasil e EUA estão a investir fortemente em África. Esta zona do globo tem-se tornado cada vez mais atractiva por via da melhoria da sua conjuntura interna, promovido pelo crescente aumento do turismo, da procura no mercado interno, do desenvolvimento do mercado imobiliário, das baixas taxas de juro e pela crescente estabilidade política.

O mercado africano deve ser visto, numa perspectiva de médio/longo prazo como uma grande oportunidade para os negócios e retorno de investimentos. Ora, tal perspectiva deriva do aparecimento e do rápido desenvolvimento da classe média, do desenvolvimento infra-estrutural, da existência de um contexto de negócios favoráveis ao crescimento económico, da resistência ao desacelaramento e estagnação do crescimento económico mundial, do crescimento do mercado interno em consequência do aumento populacional de 13% a cada 5 anos, e da valorização dos activos, que se encontram a níveis muito atractivos.

Verifica-se que as empresas africanas ligadas às matérias-primas têm vindo a despertar o interesse dos investidores estrangeiros, mas o crescimento em África não se resume a essas mercadorias. Também, os sectores da banca, transportes, comunicações, construção têm tido um crescimento notório. Com as devidas cautelas, o potencial de valorização dos investimentos realizados nesta zona poderá ser equiparável ao que actualmente se verifica em países como a China, Brasil, Índia ou Rússia.

Por isso, deve concluir-se, que é essencial que as empresas portuguesas, beneficiando das ligações históricas e económicas com vários países africanos, internacionalizem os seus negócios para esse continente, funcionando Angola e Moçambique como uma base logística para a conquista de mercado noutros países dessa região.