sexta-feira, 30 de novembro de 2012

FÉRIAS JUNTO DE FAMILIARES NO ESTRANGEIRO - ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "CONSULTÓRIO LABORAL", EM 30.11.2012


Um dos trabalhadores da secção que, atualmente, tem mais trabalho veio informar-me que, no início do próximo ano, pretende gozar as férias que se venceram em 2012 e que ainda não foram gozadas. 
Segundo este, vai uma temporada para o estrangeiro, ter com um familiar. Pode fazê-lo? E se precisarmos do trabalhador durante esse período, podemos solicitar que ele trabalhe?

A marcação do período de férias dos trabalhadores assume cada vez mais, neste período de crise, uma importância fulcral na produtividade da empresa, uma vez que é essencial manter o normal funcionamento da mesma, independentemente do gozo de férias de trabalhadores especializados.
De acordo com o artigo 237.º n.º 1 e 2 do Código do Trabalho (CT),  o trabalhador tem direito, em cada ano civil, a um período de férias retribuídas, que se vence em 1 de janeiro, sendo que este direito a férias reporta-se ao trabalho prestado no ano civil anterior, mas não está condicionado à assiduidade ou efetividade de serviço. Note-se, contudo, que a partir de 2013, o período de férias será de 22 dias por ano, sem sofrer qualquer majoração pela assiduidade.

1.    Como já aqui referimos, a marcação do período de férias deve ser efetuada por acordo entre empregador e trabalhador, seguindo-se as regras previstas no artigo 241.º do Código do Trabalho (CT). Na falta de acordo, cabe ao empregador marcar o período de férias dos trabalhadores, devendo, para esse efeito, ouvir a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa dos trabalhadores interessados.
Um dos pontos que o empregador deve ter em conta na definição do período de férias prende-se com o período em que essas férias podem ser marcadas. Na verdade, de acordo com o disposto no artigo 241.º n.º 3 CT, em “pequena, média ou grande empresa, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente.”
Assim, regra geral, as férias são gozadas no ano civil em que se vencem e entre 1 de maio e 31 de outubro. No entanto, há casos em que estas poderão ser gozadas até 30 de abril do ano civil seguinte. Com efeito, o artigo 240.º n.º 2 CT estabelece que as “férias podem ser gozadas até 30 de abril do ano civil seguinte, em cumulação ou não com férias vencidas no início deste, por acordo entre empregador e trabalhador ou sempre que este as pretenda gozar com familiar residente no estrangeiro.”
Logo, se no caso em apreço, o trabalhador solicitou o gozo de férias no ano subsequente àquele em que se venceram porque pretende deslocar-se ao estrangeiro para visitar um familiar aí residente, parece que a empresa é obrigada a permiti-lo. De facto, pela forma como a norma se encontra redigida, parece que tal direito não está condicionado ao acordo do empregador.


2.    Quanto à segunda questão, podemos respondê-la lançando mão do disposto no artigo 243.º CT, que permite a alteração do período de férias no interesse do empregador. Contudo, para que tal seja lícito, é necessário que haja “exigências imperiosas do funcionamento da empresa”.

Assim, se a presença do trabalhador for indispensável, o empregador pode alterar o período de férias já marcado ou interromper as já iniciadas, tendo o trabalhador direito a receber uma indemnização pelos prejuízos sofridos por deixar de gozar as férias no período marcado. Contudo, esta interrupção só pode ser efetuada se se garantir o gozo seguido de metade do período de férias a que o trabalhador tem direito – cfr. art. 243.º CT;


Em suma, no caso em análise, o trabalhador pode gozar as férias que se venceram em 2012 no estrangeiro, desde que o faça até 31 de abril do ano de 2013.


No entanto, se houver exigências imperiosas do funcionamento da empresa, o empregador pode solicitar que o seu colaborador não goze essas férias. No entanto, o empregador ficará obrigado a pagar todos os prejuízos que o trabalhador tenha sofrido por esse facto.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DE DESPEDIMENTO - ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "CONSULTÓRIO LABORAL", EM 22.11.2012


Ontem cheguei ao meu posto de trabalho e deparei-me com uma situação, no mínimo, caricata. O mesmo havia desaparecido.
Confrontado o meu superior hierárquico, informou-me que havia sido despedido por facto que me era imputável, por decisão que me foi entregue pessoalmente, e que devia abandonar as instalações da empresa. Este “despedimento” deve-se, na realidade, ao facto de ter insultado um colega de trabalho há mais ou menos uma semana. Contudo, até então, nunca me havia sido levantado qualquer procedimento disciplinar. Como posso reagir?

Por vezes é necessário reagir, de forma imediata, a situações que configuram um despedimento que poderá ser ilícito. Para este efeito, os trabalhadores devem conhecer os meios que têm ao seu dispor para contrariar, judicialmente, a decisão de despedimento. Esse conhecimento revelar-se-á imprescindível para garantir a efetiva defesa dos seus direitos.

Uma das principais faculdades que os trabalhadores dispõem é a providência cautelar de suspensão do despedimento, prevista e regulada nos artigos 386.º do Código do Trabalho (CT) e 34.º e ss. do Código do Processo de Trabalho (CPT).

Como o próprio nome exprime, esta providência cautelar visa suspender os efeitos práticos da decisão de despedimento, até que os motivos, e respetivos procedimentos, sejam validados pelo Tribunal.

Conforme preceitua o artigo 386.º CT, o trabalhador deve instaurar a providência de suspensão do despedimento, “no prazo de cinco dias úteis a contar da data da receção da comunicação do despedimento (…)”. Este prazo é de caducidade, pelo que o exercício não atempado desse direito prejudica a hipótese de proteção do trabalhador.

Nos termos do disposto no artigo 34.º CPT, tendo sido apresentado o requerimento inicial no prazo supra referido, o juiz ordena a citação do requerido para se opor, designando, ainda, data para a audiência final, que deve realizar-se no prazo de 15 dias.

As partes podem apresentar qualquer meio de prova, limitado a 3 testemunhas por facto, sendo certo que o tribunal pode, oficiosamente, desde que considere indispensáveis à decisão, determinar a produção de outras provas que não as indicadas – cfr. art. 35.º CPT.
Para além disso, sob pena de extinção do procedimento cautelar, no requerimento inicial deve ser requerida a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, salvo se já tal já tiver sido solicitado pelo formulário a que alude o artigo 98.º-C CPT.

Conforme referido, a ação segue com a realização do julgamento. Contudo, na falta de comparência injustificada do requerente ou de ambas as partes (sem que se tenha feito representar por mandatário com poderes especiais) a providência é logo indeferida. Na mesma linha de raciocínio, se for o requerido quem falta  à audiência, a providência é julgada procedente.

Atendendo que estamos perante uma providência cautelar onde é invocado um despedimento (alegadamente) precedido de procedimento disciplinar, o juiz, no despacho que ordena a citação do requerido, notifica-o, também, para, no prazo da oposição, juntar o procedimento disciplinar, que é apensado aos autos – cfr. art. 34.º n.º 2 CPT.

Note-se que a falta, injustificada, de apresentação deste procedimento, acarreta o decretamento da providência, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 38.º CPT. No entanto, se o não cumprimento desta obrigação for justificado até ao termo do prazo para a oposição, o juiz decide a providência com base nos elementos de prova constantes dos autos.

Conforme estabelece o artigo 39.º CPT, a suspensão é decretada “se o tribunal, ponderadas todas as circunstâncias relevante, concluir pela probabilidade séria de ilicitude do despedimento, designadamente quando o juiz conclua:
a)    Pela provável inexistência de processo disciplinar ou pela sua provável nulidade;
b)    Pela provável inexistência de justa causa (…)”.

Um dos principais efeitos do decretamento da providência tem natureza retributiva. Isto porque, a “decisão sobre a suspensão tem força executiva relativamente às retribuições em dívida, devendo o empregador, até ao último dia de cada mês subsequente à decisão, juntar documento comprovativo do seu pagamento.” – cfr. art. 39.º n.º 2 CPT.

Decretada a suspensão do despedimento do trabalhador no respetivo processo cautelar, a situação deste fica em tudo idêntica à que se encontrava antes daquele despedimento. Com efeito, o trabalhador reassume plenamente o estatuto que detinha antes do despedimento, ficando obrigado a retomar o trabalho no dia imediato ao trânsito em julgado da decisão. Isto implica, pois, que o empregador fica obrigado a permitir ao trabalhador a prestação efetiva da atividade laboral.

Em suma, no caso em apreço, o trabalhador dispõe de 5 dias úteis a contar da notificação da decisão de despedimento para instaurar um procedimento cautelar de suspensão do despedimento. Se a mesma vier a ser considerada procedente, o trabalhador tem direito a retomar o seu posto de trabalho e a ser ressarcido pela retribuição que, durante o decurso da ação, não tiver sido satisfeita pelo empregador.

Esta providência cautelar, pela celeridade que implica, permite ao trabalhador reagir imediatamente ao despedimento, protegendo, dessa forma, a manutenção da relação laboral.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL - ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "DIREITOS", EM 16.11.2012



O regime jurídico dos crimes fiscais encontra-se consagrado no Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), que substituiu o antigo Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras (RJIFNA). Nos crimes fiscais é possível distinguir dois tipos, a fraude simples ou qualificada, prevista no artigo 103.º e 104.º do RGIT e o abuso de confiança, previsto no artigo 105.º do mesmo diploma legal.

O artigo 105.º do RGIT estabelece que quem não entregar prestação tributária de valor superior a € 7.500 é punido com pena de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias para as pessoas físicas (o abuso de confiança fiscal é simples se a prestação em falta não exceder os € 50.000). No caso das pessoas colectivas ou equiparadas a pena é de multa até 720 dias, ao abrigo do disposto no artigo 12.º n.º 3 do RGIT. O anterior regime jurídico utilizava a expressão quem se apropriar, tendo sido alterada para afastar o regime do crime de abuso de confiança fiscal do crime de abuso de confiança comum. Assim, o regime fiscal prescinde da apropriação como elemento do tipo objectivo de ilícito, o que torna esta norma especial em relação a que tipifica o crime de abuso de confiança comum. Em consequência tratar-se-á de um crime omissivo puro.

O artigo 105.º n.º 5 do RGIT prevê a punição agravada de 1 a 5 anos de prisão (pessoas físicas) e de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas, mas que, ainda assim, é punido de forma menos severa que o abuso de confiança comum. Por outro lado, em sede fiscal, a tentativa na sua forma simples não é punida.

Nos termos do artigo 5.º n.º 2 do RGIT, este crime considera-se praticado na data em que termine o prazo para o cumprimento dos deveres tributários. Porém, o artigo 105.º n.º 4 do RGIT dispõe que os factos puníveis por esta disposição legal só ocorrem se tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo legal da entrega da prestação. Em consequência, também o prazo de prescrição só se inicia a partir do 91.º dia posterior ao prazo legal de entrega da prestação. Além disso, a punibilidade depende ainda de, havendo declaração, mas faltando a entrega da prestação tributária, o contribuinte notificado para o efeito, não pague a prestação devida acrescida dos juros e do valor da coima aplicável no prazo de 30 dias.

Na determinação do caracter simples ou agravado o artigo 105.º n.º 7 do RGIT dispõe que os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar á administração tributária. Portanto, o valor global das prestações não pode ser considerado para o efeito de qualificar o crime de abuso de confiança fiscal, tendo somente relevância em sede de determinação da pena para aferir do grau de ilicitude. No entanto, este facto não invalida a existência de um crime continuado, cuja existência ou não depende unicamente do preenchimento dos requisitos do artigo 30.º n.º 2 do Código Penal.

O objecto da não entrega é uma prestação tributária deduzida e que o agente estava legalmente obrigado a entregar ou que tendo sido recebida, haja obrigação legal de liquidar. Assim, a não entrega da prestação tributária pela sua não dedução, não liquidação ou não recebimento apenas constitui uma contra-ordenação por falta de entrega da prestação tributária.

Nestes crimes a autoria pertence a quem esteja obrigado pela lei tributária ao cumprimento dos deveres que são pressupostos da norma incriminadora, ou por quem actue em nome daqueles que estão obrigados ao cumprimento de tais deveres. Ora, em termos subjectivos este crime é doloso, mas se existir negligência na entrega da prestação tributária poderá eventualmente existir uma contra-ordenação.

Como supra referido, pelo crime de abuso de confiança fiscal o seu agente pode incorrer numa pena de prisão que pode ir até aos 5 anos. Ora, neste âmbito coloca-se a questão da legalidade constitucional, pela hipotética violação do princípio da proibição de prisão por dívidas, consagrado artigo 1.º do protocolo n.º 4 adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que estabelece que ninguém pode ser privado da sua liberdade pela única razão de não poder cumprir uma obrigação contratual. Porém, o Tribunal Constitucional tem entendido de forma reiterada que não se verifica a hipotética inconstitucionalidade, considerando que o princípio é apenas aplicado aos devedores de boa-fé, quanto às obrigações contratuais e não no que se refere às obrigações legais.

Finalmente refira-se que a exclusão da ilicitude do facto (o direito de necessidade ou o conflito de deveres), com base na alegação que, a não entrega das prestações tributárias, ocorreu por necessidade de pagar salários e de manter a empresa em funcionamento, tem sido rejeitada pela jurisprudência com fundamento na superioridade da obrigação de pagar impostos.

O ENCERRAMENTO DA EMPRESA NAS “PONTES” - ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "CONSULTÓRIO LABORAL", EM 16.11.2012


Estamos a planear o próximo ano de produção e pretendíamos combinar com os trabalhadores o encerramento do estabelecimento em duas “pontes”, o 26 de abril e o dia 16 de agosto.

Isto é legal? O que temos de fazer?

O planeamento atempado das férias dos colaboradores permite um controlo mais eficiente do tempo de trabalho da empresa. De facto, o conhecimento de como e quando pode a empresa encerrar por força do gozo de férias dos colaboradores é essencial para uma correta utilização dos meios produtivos.

Recorde-se que a marcação do período de férias deve ser efetuada por acordo entre empregador e trabalhador, seguindo-se as regras previstas no artigo 241.º do Código do Trabalho (CT). Na falta de acordo, cabe ao empregador marcar o período de férias dos trabalhadores, devendo, para esse efeito, ouvir a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa dos trabalhadores interessados.

Conforme estabelece o n.º 3 do artigo 241.º CT, em empresa com mais de 9 trabalhadores, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente. Uma vez definido o período de férias de todos os colaboradores, o empregador elabora o mapa de férias, com indicação do início e do termo dos períodos de férias de cada trabalhador, até 15 de abril de cada ano e mantém-no afixado nos locais de trabalho entre esta data e 31 de outubro.

Um dos pontos que o empregador deve ter em conta na definição do período de férias prende-se com a faculdade que este tem de encerrar a empresa para férias dos colaboradores. Com efeito, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 242.º CT, sempre que for compatível com a natureza da atividade, o empregador pode encerrar a empresa ou o estabelecimento, total ou parcialmente, para férias dos trabalhadores:

a)    - Até quinze dias consecutivos entre 1 de maio e 31 de outubro;

b) -  Por período superior a quinze dias consecutivos ou fora do período enunciado na alínea anterior, quando assim estiver fixado em instrumento de regulamentação coletiva ou mediante parecer favorável da comissão de trabalhadores;

c)   -  Por período superior a quinze dias consecutivos, entre 1 de maio e 31 de outubro, quando a natureza da atividade assim o exigir.

O n.º 2 do mesmo artigo 242.º CT estabelece, ainda, que o empregador pode encerrar a empresa ou o estabelecimento, total ou parcialmente, para férias dos trabalhadores:

a)   -  Durante cinco dias úteis consecutivos na época de férias escolares do Natal;

b)    - Um dia que esteja entre um feriado que ocorra à terça-feira ou quinta-feira e um dia de descanso semana.


Caso opte por encerrar a empresa num dia entre feriado e dia de descanso semanal, o empregador, até ao dia 15 de dezembro do ano anterior, deve informar os trabalhadores abrangidos das “pontes” a efetuar no ano seguinte. Esta informação assume (ainda) maior relevo porquanto o trabalho prestado para compensar o encerramento da empresa numa “ponte” pode vir a não ser considerado como trabalho suplementar, de acordo com o preceituado no artigo 226.º n.º 3 al. g) CT.

Assim, no caso em apreço, se o empregador pretender encerrar a empresa numa ponte para gozo de férias, deve, até 15 de dezembro de 2012, comunicar aos trabalhadores que a empresa se encontrará encerrada nos dias 26 de abril e 16 de agosto de 2013, para gozo de férias dos trabalhadores. As férias aí gozadas devem constar do mapa de férias que, até dia 15 de abril, tem de ser afixado na empresa.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

O CONTRATO DE TRABALHO POR TEMPO INDETERMINADO PARA CEDÊNCIA TEMPORÁRIA, ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "CONSULTÓRIO LABORAL", EM 9.11.2012



 Há vários anos que colaboro com uma empresa de trabalho temporário, tendo celebrado diversos contratos de trabalho temporário. Agora, fui contactado por outra empresa de trabalho temporário para colaborar com esta de forma permanente. Pelo que entendi, pretendem que esteja contratado por tempo indeterminado e que, de forma esporádica, seja colocado em diversos clientes da empresa.

Isto é legal? Quais as vantagens deste contrato em relação ao normal contrato de trabalho temporário?

As empresas de trabalho temporário, no exercício da sua atividade, podem celebrar duas modalidades de contratos de trabalho que lhes permite a cedência dos trabalhadores a empresas utilizadoras: o contrato de trabalho temporário e o contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária. Se a primeira modalidade é, tradicionalmente, mais utilizada, a segunda poderá ser mais útil, tanto para a empresa de trabalho temporário (ETT), como, também, para os trabalhadores temporários. Na ótica das ETT, este tipo de contrato permite que a ETT constitua um quadro permanente de trabalhadores temporários para ceder aos utilizadores, o que pode ser uma vantagem competitiva, especialmente quando estamos perante trabalhadores altamente especializados. Por outro lado, esta modalidade contratual também é interessante para os trabalhadores, ao diminuir a incerteza inerente à prestação de trabalho temporário e ao conferir maior segurança financeira a estes.

Com efeito, enquanto o contrato de trabalho temporário é tipicamente celebrado para a realização de um projeto ou obra com um prazo determinado, o contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária visa garantir a colaboração permanente do trabalhador temporário com a ETT. Isto porque, na primeira hipótese, findo o projeto o contrato de trabalho cessa e na segunda hipótese, ainda que o trabalhador não esteja cedido a um utilizador, o contrato de trabalho mantem-se. É, pois, ao contrário do contrato de trabalho temporário – que tem, necessariamente de ser celebrado a termo – um contrato por tempo indeterminado, que garante ao trabalhador temporário estabilidade no seu vínculo laboral.

Quanto aos requisitos formais para a celebração deste contrato, o artigo 183.º CT estabelece que o “contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária está sujeito a forma escrita, é celebrado em dois exemplares [sendo que um exemplar deve ficar com o trabalhador] e deve conter:

a)    Identificação, assinaturas, domicílio ou sede das partes e número e data do alvará da licença da empresa de trabalho temporário;

b)    Menção expressa de que o trabalhador aceita que a empresa de trabalho temporário o ceda temporariamente a utilizadores;

c)     Atividade contratada ou descrição genérica das funções a exercer e da qualificação profissional adequada, bem como a área geográfica na qual o trabalhador está adstrito a exercer funções;

d)    Retribuição mínima durante as cedências que ocorram.

Durante o período em que o trabalhador temporário se encontra cedido a uma empresa utilizadora está sujeito ao regime aplicável ao utilizador no que respeita ao modo, lugar, duração, bem como segurança e saúde no trabalho. Deve seguir o horário de trabalho fixado pelo utilizador e gozar férias no período marcado em acordo com este.
Todavia, ao invés do que sucede com o trabalhador que celebrou um contrato de trabalho temporário, o trabalhador com contrato por tempo indeterminado para cedência temporária, no período em que não se encontre em situação de cedência, pode prestar a sua atividade à empresa de trabalho temporário.

Mas uma das principais vantagens, no que diz respeito ao trabalhador temporário, na celebração de um contrato por tempo indeterminado para cedência temporária é que, mesmo que o trabalhador não se encontre cedido ou esteja a trabalhar na ETT, tem direito a auferir uma compensação. É que, por força do disposto no artigo 184.º n.º 2 CT, durante o período sem cedência, o trabalhador tem direito:

a)    Caso não exerça atividade, a compensação prevista em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, ou no valor de dois terços da última retribuição ou da retribuição mínima mensal garantida, consoante o que for mais favorável;

b)    Caso exerça atividade à empresa de trabalho temporário, a retribuição correspondente à atividade desempenhada, sem prejuízo do valor referido no contrato de trabalho.


Assim, se, no caso em apreço, tanto a ETT como o trabalhador pretenderem celebrar o contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária, nada obsta a que o façam, até porque, como vimos, este pode ser um tipo de contrato que traz vantagens para as partes contraentes.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

VENDAS ONLINE - ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "DIREITOS", EM 2.11.2012


Tenho recebido, no meu telemóvel, uma grande quantidade de sugestões para adquirir bens pela Internet. Algumas interessam-me, mas ouvi dizer que é muito perigoso.

Posso comprar sem problemas? Que cuidados devo ter?

Com o crescimento do comércio eletrónico, a oferta de produtos passou a apresentar-se sob formas cada vez mais diversas, o que conduziu ao aumento da complexidade das questões jurídicas a ele associadas. O recente fenómeno dos websites de compras coletivas tem originado muitas queixas por parte dos consumidores.

Nessas páginas podem-se comprar bens ou serviços das mais variadas empresas por um preço mais económico do que o praticado nas suas lojas físicas. Os compradores recebem por e-mail um “voucher” que incorpora o direito a receber um produto ou a exigir a prestação de um serviço por parte de um determinado estabelecimento. Porém, muitos problemas têm surgido a propósito deste modelo de contratação, desde a não entrega do produto ou a recusa da realização da prestação do serviço por parte das empresas “físicas” até à inexistência ou encerramento das mesmas.

Estes contratos caracterizam-se como contratos de adesão, isto é, o seu conteúdo encontra-se predefinido pelo predisponente (a sociedade detentora do website de compras coletivas) através de cláusulas contratuais gerais, não podendo o aceitante (o consumidor) negociar as condições propostas, resumindo-se assim a sua autonomia contratual à aceitação ou não aceitação do contrato predisposto. O Decreto-Lei 446/85 de 25 de Outubro regula este tipo de contratos e comina com a nulidade vários tipos de cláusulas que visam criar um manifesto desequilíbrio entre os direitos e as obrigações das partes em favor do predisponente, designando-as como cláusulas abusivas. É comum os websites de compras coletivas incluírem cláusulas que excluem a sua responsabilidade pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso das obrigações por parte dos titulares dos estabelecimentos que fornecem os produtos ou prestam os serviços.

Entendemos que tais cláusulas são absolutamente proibidas, já que preenchem a previsão da alínea d) do artigo 21º do Decreto-Lei 446/85, e, consequentemente, nulas. As cláusulas que estabelecem que os “vouchers” não atribuem o direito ao uso de serviços ou à aquisição de produtos num determinado momento à escolha do consumidor, sendo necessário, em consequência, combinar individualmente com o parceiro a data para a entrega do produto ou para a prestação do serviço, também devem ser consideradas absolutamente proibidas e, portanto, nulas. Isto porque essas cláusulas podem dificultar a satisfação do direito que o “voucher” incorpora, limitando-se assim a obrigação de garantia que a sociedade titular do website assume de que o “voucher” atribui um direito à prestação do serviço ou ao fornecimento do produto pelo Parceiro, preenchendo-se dessa forma a previsão da alínea a) do artigo 21º do do Decreto-Lei 446/85. 

Os contratos em análise são celebrados sem a presença física e simultânea das partes, mas antes através de uma técnica de comunicação à distância (meios de comunicação eletrónica), pelo que também estão sujeitos ao regime jurídico do DL 143/2001 de 26 de Abril. Por isso, no âmbito dessa relação jurídica o consumidor goza do direito de resolver o contrato (artigo 6º do DL 143/2001), que implica a destruição retroativa dos efeitos de negócio celebrado e, consequentemente, a devolução do bem comprado e a restituição do montante despendido com a sua aquisição. Para exercer este direito o consumidor deve enviar uma carta registada com aviso de receção ao outro contraente ou à pessoa para tal designada no prazo de 14 dias após a receção do bem na qual manifeste a vontade de resolver o contrato, não sendo necessária a indicação de qualquer motivo. Nalguns casos excecionais o prazo anteriormente referido é alargado.

Assim, caso tenha problemas em utilizar o “voucher” que adquiriu, o consumidor pode devolvê-lo e exigir o preço que por ele pagou à sociedade detentora do sítio de compras coletivas. Porém, muitas vezes aquela recusa-se a fazer a restituição. Nesse caso poderá intentar-se uma ação judicial para recuperar o pagamento feito antecipadamente. Mas se essa sociedade não estiver sediada nem representada por nenhuma sucursal em Portugal é muito complicado conseguir executar uma decisão que a condene.

O consumidor também dispõe de meios de defesa face à empresa que comercializa o produto ou que presta o serviço. Isto porque, como já foi acima referido, o “voucher” incorpora o direito a uma prestação por parte dessa empresa (entrega de um produto ou realização de um serviço). Por isso, o consumidor poderá intentar uma ação de cumprimento contra a sociedade titular da empresa física e, se esta não cumprir, pedir uma indemnização pelo não cumprimento da obrigação, que incluirá, naturalmente, o dinheiro despendido com a compra do “voucher”. No entanto, esta solução não está expressa na lei, pelo que seria vantajosa uma legislação específica para os contratos celebrados através dos websites de compras coletivas.

O SUBSÍDIO DE DESEMPREGO PARA TRABALHADORES INDEPENDENTES -ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "CONSULTÓRIO LABORAL", EM 2.11.2012


Trabalhei, em regime de exclusividade, para a mesma empresa há 5 anos, na qual prestava serviços de informática. Durante esse período de tempo, realizei a minha atividade com base num contrato de prestação de serviços.
Agora, a empresa fez cessar o contrato de prestação de serviços. Tenho direito ao subsídio de desemprego?
  
Até há bem pouco tempo, os trabalhadores independentes não tinham qualquer proteção na eventualidade de desemprego. Contudo, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 65/2012, de 15 de março (DL 65/2012), a situação alterou-se.

De facto, com a aplicação deste diploma legal, foi instituído um “regime jurídico de proteção na eventualidade desemprego, de natureza contributiva, que tem como âmbito pessoal os trabalhadores independentes que prestam serviços a uma entidade contratante da qual dependam economicamente” – cfr. Preâmbulo do DL 65/2012.

A finalidade deste diploma era a de estender aos trabalhadores independentes, isto é, aqueles que não são, para efeitos de Segurança Social, considerados como trabalhadores por conta de outrem, a proteção no desemprego. Todavia, este direito não pode ser usufruído por todos os trabalhadores independentes, mas, apenas, por aqueles que estejam em situação de dependência económica de uma única entidade contratante. Ou seja, este benefício existe apenas para os trabalhadores que, no mesmo ano civil, obtenham da mesma empresa, seja ela uma pessoa coletiva ou uma pessoa singular com atividade empresarial, 80% ou mais do valor anual dos rendimentos obtidos na atividade independente.

De acordo com o artigo 4.º do DL 65/2012, a proteção social na eventualidade de desemprego efetiva-se mediante a atribuição do subsídio por cessação de atividade e do subsídio parcial por cessação de atividade. O primeiro visa compensar a perda de rendimentos do prestador de serviços em consequência da cessação involuntária da atividade independente, resultante da cessação de contrato de prestação de serviços com a entidade contratante. A segunda prestação pecuniária, por seu lado, será atribuída nas situações em que o prestador de serviços, após cessar o contrato de prestação de serviços, mantenha uma atividade profissional correspondente aos restantes 20% ou a menos do valor total anual dos seus rendimentos de trabalho.

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do DL 65/2012, o “reconhecimento do direito ao subsídio por cessação de atividade ao trabalhador independente da verificação cumulativa das seguintes condições:

a)    Cessação involuntária do vínculo contratual celebrado com a entidade contratante;

b)    Cumprimento do prazo de garantia;

c)     Cumprimento da obrigação contributiva das entidades contratantes do trabalhador independente, nessa qualidade, em pelo menos dois anos civis, sendo um deles o ano imediatamente anterior ao da cessação do contrato de prestação de serviços;

d)    O trabalhador independente ser considerado economicamente dependente à data da cessação do contrato de prestação de serviços;

e)    Inscrição no centro de emprego da área de residência, para efeitos de emprego.”

O prazo de garantia para atribuição destas prestações é de 720 dias de exercício de atividade independente, economicamente dependente, num período de 48 meses imediatamente anterior à data da cessação involuntária do contrato de prestação de serviços.

O montante diário do subsídio por cessação de atividade é calculado de acordo com uma fórmula prevista no artigo 10.º DL 65/2012, que tem por base o escalão de base de incidência contributiva e a percentagem correspondente à dependência económica do beneficiário.

O requerimento para atribuição do subsídio por cessação de atividade deve ser apresentado no prazo de 90 dias a contar da data do desemprego por cessação do contrato de prestação de serviços e precedido de inscrição para emprego no centro de emprego – cfr. art. 11.º DL 65/2012. Este requerimento tem, necessariamente, de ser instruído com a informação comprovativa da situação de cessação involuntária do contrato de prestação de serviços, podendo ser entregue online, no sítio da internet da Segurança Social.

O financiamento destes subsídios é conseguido através das contribuições das entidades contratantes sobre serviços prestados por trabalhadores independentes, nos termos previstos no artigo 140.º do Código dos Regimes Contributivos. Recorde-se que incumbe a estas entidades contratantes o pagamento de uma taxa contributiva de 5% sobre o valor dos serviços prestados pelos trabalhadores independentes em situação económica dependente.

Em suma, no caso em apreço, se o trabalhador independente reunir as condições que o DL 65/2012 estabelece, terá direito a proteção na eventualidade de despedimento. Contudo, para que tal suceda, também é imprescindível que a entidade contratante tenha liquidado a taxa contributiva de 5% a que alude o artigo 168.º n.º  4 do Código dos Regimes Contributivos (Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro).