sexta-feira, 14 de setembro de 2012

PENSÃO DE ALIMENTOS: DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL - ARTIGO PUBLICADO NA VIDA ECONÓMICA, NA RUBRICA "DIREITOS", EM 14.09.2012



 Sou uma cidadã francesa, que durante alguns anos residiu em Portugal. Em 2010 divorciei-me, tendo-me sido atribuída uma pensão de alimentos. Desde essa data voltei a residir em França, mas como o meu ex-marido reside em Portugal a administração tributária portuguesa pretende tributar-me esse rendimento. Existirá fundamento para tal pretensão?

No caso em apreço, estamos perante uma situação tributária plurilocalizada. Assim, é necessário analisar o enquadramento fiscal no estado da residência (França) e no estado fonte (Portugal), bem como analisar o conteúdo da convenção entre Portugal e França para evitar a dupla tributação (doravante CDT).
O artigo 23.º da CDT estabelece que “os elementos do rendimento de um residente de um Estado Contratante não expressamente mencionados nos artigos anteriores só podem ser tributados nesse Estado, desde que estejam nele sujeitos a imposto em conformidade com a respectiva legislação fiscalEste artigo, que tem natureza residual, é aplicável ao rendimento proveniente de pensões de alimentos, pois, tal rendimento não se encontra mencionado nos restantes artigos da convenção. Por isso, o direito de tributação cabe exclusivamente ao Estado da residência, sendo que esta regra só será alterada se o Estado da residência não tributar tais rendimentos.

Posto isto, é preciso estabelecer qual é a residência fiscal da consulente. Segundo a lei fiscal portuguesa, são consideradas residentes, entre outras situações, as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos, hajam permanecido em Portugal por mais de 183 dias, ou disponham, em 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual. Ora, não ocorrendo nenhuma das situações acima referidas, a consulente apenas poderá ser tributada, em Portugal, como não residente, nos termos do artigo 13.º e 18.º do Código de IRS (CIRS). Além disso, nos termos do citado artigo 18.º n.º 1, aliena l) do CIRS, consideram-se rendimentos obtidos em Portugal, as pensões devidas por entidade que tenha residência em território português. Assim, se o devedor da pensão tiver residência em Portugal o rendimento considera-se aqui obtido.

Além disso, é necessário analisar se as pensões de alimentos são um rendimento tributável em sede de IRS. O artigo 11.º n.º 1, alínea c) do CIRS, estabelece que se consideram pensões para efeitos de rendimentos da categoria H, “as pensões e subvenções não compreendidas nas alíneas anteriores”, como serão, nomeadamente, as pensões de alimentos. Nestes termos, a Administração Tributária portuguesa está legitimada a tributar a aludida pensão a residentes ou a não residentes quando o rendimento se considere aqui obtido. No entanto, como estamos perante uma situação plurilocalizada, é necessário analisar a mesma situação segundo as normas fiscais francesas. Nos termos do artigo 4.º-B do Código Geral dos Impostos francês, são considerados residentes as pessoas que têm a sua casa em território francês ou aí se situa o principal local de residência. Ora, no caso em análise, a consulente tem residência em França. Quanto à tributação das pensões de alimentos, a legislação fiscal francesa também as tributa, pois, o artigo 79.º do referido código dispõe que as pensões concorrem para a formação do rendimento global, que serve de base ao imposto sobre o rendimento. Portanto, ambos os Estados podem tributar este rendimento, razão pela qual a Administração Tributária deveria aplicar a regra residual, prevista no artigo 23.º da CDT, que tem como consequência que a consulente apenas pode ser tributada pelo Estado da residência (França). Além disso, como França também tributa as pensões de alimentos não se coloca o problema mencionado na última parte da referida disposição legal, quando o Estado da residência não tributa o referido rendimento.

Em conclusão, a consulente não pode ser tributada em Portugal, não tendo que entregar qualquer declaração de IRS, relativa ao ano de 2010. No entanto, como a residência é o elemento fulcral do problema que se analisou, será necessário apresentar um certificado de residência, a ser emitido pelas autoridades fiscais francesas, requerendo a aplicação da referida Convenção relativa à dupla tributação.

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