sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

É ALGO EXAGERADA A NOTÍCIA DA MORTE DO GOVERNO

Uma crise política seria o acontecimento político que menos poderia interessar a Portugal neste momento em que tantos cidadãos já sofrem no quotidiano os efeitos de todas as crises.

            É simplória e, até, néscia além de, seguramente, interesseira, a ideia que anda a correr, também nalguns recantos da comunicação social, de que o único desígnio das políticas do Governo é a sobrevivência de Sócrates no poder.
            Não é que este não lhe esteja agarrado como uma lapa, mas é sinal de despeito, arrogância e ignorância mesmo levar tudo o que acontece à conta dessa alegada pretensão. O fenómeno político em causa é bem mais vasto e mais profundo, arrasta consigo implicações profundas, tendo a ver com o sistema político e seus figurantes considerados globalmente.
            De resto, também, a opinião simétrica de que a Oposição tem como único desígnio derrubar o Governo igualmente padece de críticas, seguramente. Não se poderá acreditar que, com efeito, o único intento dos políticos seja o “jogo das cadeiras”. Por mais desqualificados que estejam perante a opinião pública, os políticos deste regime que nos controla – e estão, geralmente – não serão de aceitar aquelas premissas para, daí, tirar qualquer conclusão que seria, sempre, parcial e de nenhumas consequências práticas.
            Infelizmente, da vida pública a maioria dos cidadãos só conhece – quando conhece! – algumas declarações bombásticas que os diversos media trazem regularmente ao espaço público e que, depois, são glosadas em conversas e tertúlias, pouco mais que de barbearia, sem as escalpelizar, criticar, ou apurar o seu fundamento. Em regra é o mero fanatismo partidário que traça o itinerário dos “slogans” postos a circular no dia-a-dia do negócio, endogámico, que a comunicação social (e certos gurus que ela apadrinha) e os partidos desenvolvem no seu interesse próprio mais do que no interesse público.
            A anunciada morte do Governo, que foi decretada por um douto comentador político em momento de alguma excitação, insere-se no paradigma dos “boatos” acima referido. Se não morreu o Governo, há-de, porém, repetir-se tantas vezes essa declamação, que, ao menos até à próxima declaração popularucha, vai ser objeto de conversa fiada e de prazer para alguns…
            Uma crise política seria, creio, o acontecimento político que menos poderia interessar a Portugal neste momento em que tantos cidadãos já sofrem no quotidiano os efeitos de todas as crises. Apelar à sensatez de quem vive dos jogos políticos – e, por aí, não vive sem escândalos e sensacionalismo – poderá ser inútil porque faz parte, este perfil, da sua natureza. Mas terá de haver um mínimo de bom senso e de patriotismo, também, no marketing político-partidário que enche a cena da nossa vida pública.
            E nisto não deixará de ir uma avaliação sobre o Governo, que aparece, claramente, como fatigado e a perder a ambição. Mas vai mais do que isso, ou seja, vai também a pergunta necessária e óbvia: e depois da queda deste Governo?
Há que ter muito cuidado com o desregramento verbal quando envolve, sobretudo, aquele veneno que cativa o público, mas não tem em conta o interesse público.
Vivemos numa sociedade de risco e de perigos.
Antes, nas sociedades industrializadas, era comum e compreensível o grito “tenho fome”; hoje, na sociedade de risco que é a nossa, o grito é outro: “tenho medo” (ainda que não tenha acabado a fome…). Ora o medo convertido em instrumento político, ou da política, é deveras preocupante.
A irresponsabilidade organizada (Ulrich Beck) contém ameaças gravíssimas ao nosso tempo e cria um certo “reino de sombras” com deuses e demónios que ameaçam a própria sobrevivência democrática.
À liberdade de opinião vai faltando a criatividade que é necessária a uma sociedade diferente e melhor. Que há muita coisa que está mal todos os sabemos; dizer como mudar é que seria útil. Dizê-lo com realismo, convicção e saber.
Mas isto não vende.

                                                                       E-mail: antoniovilar@antoniovilar.pt

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