sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Procedimento disciplinar

Sou superior hierárquico com competência disciplinar e reparei que um dos nossos trabalhadores violou os seus deveres laborais. Tendo em conta a relativa gravidade da situação, não quero despedir o trabalhador mas quero aplicar uma sanção, de forma a dar exemplo aos demais. Que sanções posso aplicar, quais os respetivos limites e qual o procedimento a adotar?
No âmbito do instituto disciplinar laboral privado, existe o procedimento disciplinar comum e o procedimento disciplinar para aplicação da sanção de despedimento.
No procedimento disciplinar comum, que aqui importa analisar, podemos ter a aplicação de várias sanções disciplinares, nomeadamente repreensão, repreensão registada, sanção pecuniária, perda de dias de férias e suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, sendo certo que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (IRCT) pode prever outras sanções desde que não prejudiquem os direitos e garantias do trabalhador.
A aplicação das sanções deve respeitar os seguintes limites: as sanções pecuniárias por infrações praticadas no mesmo dia não podem exceder um terço da retribuição diária e, em cada ano civil, a retribuição correspondente a 30 dias, a perda de dias de férias não pode pôr em causa o gozo de 20 dias úteis, a suspensão do trabalho não pode exceder 30 dias por cada infração e, em cada ano civil, o total de 90 dias.
Apesar de se denominar procedimento disciplinar comum, verifica-se a uma ausência de previsão legal da sua tramitação processual, existindo apenas uma previsão de atos isolados. Assim, na aplicação de qualquer tipo de sanção disciplinar, à exceção da mera repreensão, entende-se que o formalismo processual a adotar seja semelhante ao que seria se a sanção configurada fosse o despedimento, nomeadamente com a sua redução a escrito.
Com efeito, existem mais vantagens em tratar uniformemente o procedimento disciplinar (o comum e o tendente ao despedimento), sempre com a sua redução a escrito, pelas seguintes razões:
- O direito de apresentar uma resposta escrita à acusação formulada pelo empregador tem por base o direito do trabalhador à audiência prévia (n.º 6 do artigo 329.º do Código do Trabalho (CT));
- Evitar-se-ão processos de contraordenação, designadamente os decorrentes da violação do princípio da audiência prévia, da omissão do registo atualizado das sanções disciplinares, da não executar a sanção no prazo de três meses subsequentes à decisão, e da violação dos limites na aplicação de sanções disciplinares conservatórias;
- Por outro lado, se o processo disciplinar for escrito, diminui a existência de práticas reiteradas e discriminatórias na aplicação de sanções abusivas, oferecendo dessa forma, mais garantia de defesa ao trabalhador;
- As normas relativas à repercussão do tempo no processo disciplinar tanto se aplicam ao processo disciplinar comum como ao processo disciplinar tendo em vista o despedimento.
- Sendo os processos reduzidos a escrito, com cumprimento das formalidades impostas pela lei, será interpretado mais facilmente como circunstância agravante a prática reincidente do trabalhador, caso este último volte a violar os seus deveres laborais e a vontade da empresa seja a aplicação de uma sanção mais grave ou até mesmo o despedimento.
Em conclusão, diríamos que a empresa é uma estrutura indispensável na vida em sociedade, mas não deve esquecer que o trabalhador é sempre um cidadão, devendo reconhecer-lhe os seus direitos fundamentais, nomeadamente no âmbito do procedimento disciplinar. Assim, no âmbito da aplicação de sanções disciplinares, deve se assegurar o amplo direito de defesa por escrito, tendo por base a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.
Na verdade, esta é uma forma de prevenir futuras violações dos deveres laborais, transmitindo, deste modo, uma ideia de rigor, ordem, disciplina e reintegração indispensável na relação laboral, blindando a sua decisão e, dessa forma, tornando mais difícil a impugnação judicial da decisão aplicada pelo empregador.
(artigo publicado no Jornal Vida Económica de 11-11-2011 - Consultório Laboral, Veja este e todos os que temos publicado até à data de hoje)
João Vilas Boas Sousa
Gabinete de Advogados António Vilar & Associados

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