sexta-feira, 8 de julho de 2011

Acidentes de trabalho


Somos uma empresa espanhola, com trabalhadores espanhóis, que começou a exercer a sua atividade aqui em Portugal. Disseram-nos que devemos celebrar um seguro para os eventuais acidentes de trabalho. É assim? Que medidas devo tomar caso suceda um acidente de trabalho?

O regime de reparação dos danos provenientes de acidente de trabalho, em Portugal, é bastante distinto do previsto em Espanha. Com efeito, ao invés do que sucede nesse país, em Portugal vigora um sistema de proteção de caráter privado, com base no seguro obrigatório, regulamentado pelo Estado.

Mas, antes de analisarmos o sistema legal e suas obrigações, importa aferir o que, para efeitos legais, é considerado acidente de trabalho. Ora, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 8.º da Lei 98/2009, de 4 de setembro (doravante Lei 98/2009), que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, é acidente de trabalho aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte”.

Acresce o artigo 9.º do mesmo diploma legal que, entre outros, também é considerado de trabalho o acidente ocorrido no trajeto de ida para o local de trabalho ou de regresso deste.

O regime legal de reparação de acidentes de trabalho é baseado no pressuposto de que as entidades empregadoras, como beneficiam do trabalho prestado pelos trabalhadores, devem responder pela reparação das consequências dos acidentes de trabalho que estes sofram ao seu serviço.

No entanto, a Lei 98/2009 obriga a que os empregadores transfiram a sua responsabilidade pela reparação dos danos decorrentes de acidente de trabalho, relativa a todos os seus trabalhadores, para uma companhia de seguros. Desta forma, quem, efetivamente, suporta os danos resultantes de um eventual acidente de trabalho é o segurador e não a entidade empregadora.
Assim, se o empregador não contratar este seguro, fica responsável pela reparação do acidente de trabalho. Também assim será se a entidade empregadora não tiver incluído o trabalhador sinistrado na relação de trabalhadores que envia ao segurador.
Note-se, ainda, que, quando a retribuição declarada para efeito do prémio de seguro for inferior à real, a seguradora só é responsável em relação àquela retribuição, que não pode ser inferior à retribuição mínima mensal garantida.

Porque o empregador deve informar o trabalhador sobre aspetos relevantes do contrato de trabalho, a lei laboral exige que este seja informado do número da apólice de seguro de acidentes de trabalho e da identificação da entidade seguradora.

O facto de, no caso em apreço, os trabalhadores serem de nacionalidade espanhola em nada modifica estas obrigações legais. Pois, por força do disposto no artigo 5.º da Lei 98/2009, o trabalhador estrangeiro que exerça atividade em Portugal é, para efeitos da presente lei, equiparado ao trabalhador português. Apenas assim não será se o trabalhador sinistrado, estrangeiro, exerça uma atividade temporária ou intermitente e, por acordo entre Estados, se tenha convencionado a aplicação da legislação, relativa à proteção do sinistrado em acidente de trabalho, em vigor no Estado de origem.

Na eventualidade de um acidente de trabalho, o empregador tem o dever de preencher e enviar a participação de sinistro de acidente de trabalho à companhia de seguros contratada, no prazo máximo de 24 horas, a partir do seu conhecimento.
Todavia, para que o empregador tenha conhecimento do acidente de trabalho será necessário que o sinistrado o participe, verbalmente ou por escrito, nas 48 horas seguintes. Caso o trabalhador não comunique o acidente tempestivamente e, por tal, tenha sido impossível prestar-lhe a assistência necessária, determina o n.º 4 do artigo 86.º da Lei 98/2009 que “a incapacidade judicialmente reconhecida como consequência daquela falta não confere direito às prestações estabelecidas na lei (…)”. Logo, se o acidente de trabalho não for comunicado à companhia seguradora, esta não fica obrigada a pagar qualquer importância, ficando o empregador responsável pela reparação de todos os danos resultantes do sinistro. No entanto, se for o trabalhador que não tenha comunicado o sinistro no prazo correto, não cabe ao empregador a responsabilidade pela não prestação de assistência médica no momento.

Em suma, no caso em apreço, ao empregador compete celebrar um contrato de seguro de acidentes de trabalho e, bem assim, comunicar à companhia de seguros qualquer acidente de trabalho que ocorra. Não obstante, não podemos olvidar que, sobre a entidade empregadora, recai, também, a obrigação de, logo que tenha conhecimento do acidente, assegurar os imediatos socorros médicos ao sinistrado e, se for necessário, assegurar o transporte para o estabelecimento de saúde.

Ricardo Vieira Meireles
Gabinete de Advogados António Vilar & Associados

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