quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O crédito de horas para formação profissional

Trabalho na mesma empresa desde 2007 e até à presente data nunca fui incluído em nenhuma das ações de formação promovidas.
Sucede que agora há um curso que tem muito interesse para mim, contudo é lecionado durante o meu horário de trabalho. Para além disso, não posso, neste momento, fazer um investimento para pagar essa formação.
Posso exigir ao meu empregador dispensa para frequentar o curso que quero? E o pagamento (de parte) desse curso?

A formação profissional incumbe, desde logo, ao próprio Estado. Esta incumbência é reconhecida no artigo 6.º da Lei 7/2009, de 12 de fevereiro que aprovou a revisão do presente Código do Trabalho. Refere, então, este normativo, que compete ao Estado garantir o acesso dos cidadãos à formação profissional, permitindo a todos a aquisição e a permanente atualização dos conhecimentos e competências. A formação profissional é, contudo, uma obrigação do Estado que se encontra delegada para o empregador quanto aos respetivos custos. Por isso, um dos deveres do empregador, no decorrer da relação laboral, é fornecer ao trabalhador formação profissional, para dotá-lo de competências que permitam aumentar a sua produtividade e, desta forma, a da empresa. É, pois, um dever do empregador que, indiretamente, lhe traz mais-valias.

De acordo com o disposto no artigo 131.º n.º 2 do Código do Trabalho, o trabalhador tem direito, em cada ano, a um número mínimo de 35 horas de formação contínua ou, sendo contratado a termo por período igual ou superior a três meses, um número mínimo de horas proporcional à duração do contrato nesse ano.

A formação profissional pode ser desenvolvida pelo empregador, por entidade formadora certificada ou por estabelecimento de ensino reconhecido pelo ministério competente e dá lugar à emissão de certificado que comprove a execução da ação de formação. O artigo 13.º da Lei 105/2009 estabelece que o empregador deve elaborar o plano de formação, anual ou plurianual, com base no diagnóstico das necessidades de qualificação dos trabalhadores.

Sublinhe-se, porém, que, nos termos do n.º 5 do referido normativo, o empregador apenas deve assegurar, em cada ano, formação contínua a 10% dos trabalhadores da empresa. Para além disso, o empregador pode antecipar até dois anos ou, desde que o plano de formação o preveja, diferir por igual período, a efetivação da formação anual. Por isso, tal como sucedeu no caso em análise, alguns trabalhadores podem não ser incluídos nas ações de formação promovidas pelo empregador.

Por força do disposto no artigo 132.º do Código do Trabalho, as horas de formação que não sejam asseguradas pelo empregador até ao termo dos dois anos posteriores ao seu vencimento, transformam-se em crédito de horas, em igual número, para formação por iniciativa do trabalhador.

Pretende-se, então, acautelar que o trabalhador tenha acesso a formação profissional, desde logo através do empregador, ou caso este não a proporcione, subsidiariamente, permite-se que seja o próprio trabalhador a diligenciar pelo acesso à aludida formação. Compreende-se, por isso, que o n.º 2 do artigo 132.º CT estabeleça que o crédito de horas para formação confira direito a retribuição e conte como tempo de serviço efetivo, para além de ser referido ao período normal de trabalho. Significa, pois, que a utilização do crédito de horas não acarreta a perda de quaisquer direitos do trabalhador, porquanto se aceita que este é um período de tempo que será utilizador para a valorização profissional do colaborador.

O trabalhador pode utilizar o crédito de horas para a frequência de ações de formação, mediante comunicação ao empregador com a antecedência mínima de 10 dias – cfr. art. 132.º n.º 3 CT. Sublinhe-se, ainda, que em caso de cumulação de créditos de horas, a formação realizada é imputada ao crédito vencido há mais tempo.

No caso em análise, o trabalhador já dispõe de crédito de horas para formação contínua, pelo que poderá comunicar ao empregador que pretende utilizá-lo na frequência da ação de formação que descobriu. Quanto ao pagamento do custo da formação, será prudente o trabalhador propor essa hipótese ao empregador, uma vez que o Código do Trabalho prevê que, por acordo, possa ser estabelecido um subsídio para pagamento do custo da ação de formação. Esse subsídio ascenderá, no máximo, ao valor da retribuição do período de crédito de horas utilizado.

(Consultório Laboral – Artigo publicado no jornal Vida Económica 09-09-2011)

Ricardo Meireles Vieira
Gabinete de Advogados António Vilar & Associados

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