terça-feira, 10 de maio de 2011

Horário concentrado


Somos uma empresa que, pela natureza das matérias-primas que utiliza, tem necessariamente de ter jornadas de trabalho alargadas. Atualmente, pagamos aos nossos trabalhadores o acréscimo do trabalho suplementar pelas horas trabalhadas para além horário de trabalho. Há alguma forma de alterar este modelo?

A utilização reiterada do trabalho suplementar nunca pode ser uma política de gestão de tempo de trabalho vigente numa empresa. Com efeito, o trabalho suplementar deve ter uma natureza excecional, devendo, por isso, encontrar-se, na legislação laboral, outros mecanismos de organização do tempo de trabalho que se adeqúem melhor às necessidades produtivas.

A revisão do Código do Trabalho de 2009 (aprovada pela Lei n.º 7/2009, de 12/02) tinha como fundamento facultar, ao tecido empresarial, os meios necessários para inverter o fraco crescimento económico, através da reorganização das relações de trabalho, no intuito de aumentar a eficiência e a competitividade da economia. Com efeito, a Lei n.º 7/2009, de 12/02, foi apresentada como um instrumento no combate à precariedade no emprego e na maior adaptabilidade das relações laborais às exigências do mercado.
Entre as novidades que este diploma legal positivou, umas mais úteis que outras, figura a do horário concentrado, prevista e regulada no artigo 209.º do Código do Trabalho. De acordo com o n.º 1 deste inciso legal, o período normal de trabalho pode ser aumentado até quatro horas diárias:
a)                    por acordo entre empregador e trabalhador ou por instrumento de regulamentação coletiva, para concentrar o período normal de trabalho semanal no máximo de quatro dias de trabalho;
b)                    por instrumento de regulamentação coletiva para estabelecer um horário de trabalho que contenha, no máximo, três dias consecutivos, seguidos no mínimo de dois dias de descanso.

Retira-se, então, deste preceito que por horário concentrado deve entender-se a organização do tempo de trabalho em que o cumprimento do período normal de trabalho é efetuado num número menor de dias que o habitual. Isto permite, então, que em vez de ser aplicado um horário de trabalho que prevê a execução de 8 horas de trabalho em 5 dias da semana, pode determinar-se um horário de trabalho com 3 dias em que se trabalha 12 horas diárias.
Trata-se do estabelecimento, por acordo individual ou instrumento de regulação coletiva de trabalho, do aumento do período normal de trabalho até 4 horas diárias no máximo de 4 dias de trabalho. Por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, o período normal de trabalho pode, ainda, ser aumentado até 4 horas diárias no máximo de 3 dias consecutivos, seguidos de 2 dias de descanso, sem prejuízo da duração média num período de referência de 45 dias.
Uma vez que, no caso em apreço, não temos informação se à relação laboral em causa, é aplicável um instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, abordaremos, mais detalhadamente, apenas a hipótese do horário concentrado ser fixado por acordo entre trabalhador e empregador. Relativamente a esta modalidade, importa referir que a mesma pode surgir em dois momentos da relação: ou o trabalhador é contratado para prestar o seu trabalho neste regime, pelo que o acordo das partes é plasmado no contrato de trabalho, ou, então, poderão as partes, no decorrer do contrato, acordar na utilização deste regime.

Ainda que o artigo 209.º CT não o determine expressamente, o acordo entre as partes para aplicação do regime de horário concentrado deve ser celebrado por escrito, porquanto a determinação (e qualquer eventual alteração) do período normal de trabalho deve ser comunicada, por escrito, ao trabalhador, de acordo com o disposto no artigo 106.º CT.

Sublinhe-se que, a partir do momento em que o horário concentrado é estabelecido, o empregador apenas o poderá alterar se tiver a anuência do trabalhador. Isto porque, ao invés do que sucede com a grande maioria das relações laborais, em que o empregador pode alterar o horário de trabalho (cfr. art. 217.º CT), o horário concentrado é individualmente acordado e, por isso, o empregador não o pode modificar unilateralmente.

De acordo com o previsto no n.º 3 do artigo 209.º CT, compete ao instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que institua o horário concentrado a regulação da retribuição e outras condições da sua aplicação. Ainda que não exista, na lei laboral, preceito paralelo para o caso em que o horário concentrado é fixado por acordo, resulta do princípio da liberdade contratual que as partes podem regular os vários efeitos da utilização do horário concentrado, como a retribuição ou as condições efetivas da sua aplicação.
                      
Em conclusão, o horário concentrado permite gerir o tempo produtivo dos colaboradores, garantindo, por vezes, uma melhor adequação da mão de obra aos ciclos produtivos. Para além disso, o horário concentrado pode ser uma forma de promover a compatibilização entre a vida profissional e a familiar. Isto porque, desta forma, em vez de o trabalhador ficar invariavelmente para além do horário de trabalho a prestar trabalho suplementar, concentra a execução do seu trabalho em menos dias, podendo, assim, gozar de mais tempo livre “útil”.

Gabinete de Advogados António Vilar & Associados
Ricardo Meireles Vieira


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