terça-feira, 31 de maio de 2011

LEGAL E ILEGAL

A minha empresa é credora de uma sociedade a quem concedeu um empréstimo garantido por hipoteca. A referida hipoteca encontra-se registada sobre um prédio que a sociedade doou a um dos seus sócios e que, num outro processo executivo, se encontra arrestado. A sociedade não cumpriu nunca com as suas obrigações para com a minha empresa e tenho conhecimento que se encontra numa grave crise financeira. Que poderei fazer para assegurar o pagamento do meu crédito, uma vez que o imóvel hipotecado já nem sequer é da propriedade da devedora?

A dissipação do património por parte das empresas em dificuldades económicas é, cada vez mais, uma realidade alarmante e que poderá, em certos casos, constituir um entrave ao ressarcimento das dívidas contraídas junto dos credores.
No entanto, em relação aos credores com garantia real, como a hipoteca, a alienação dos bens não cria uma dificuldade incomportável para aqueles, uma vez que uma das características dos direitos reais é o direito de sequela. Ou seja, o titular da hipoteca tem a faculdade de fazer valer o seu direito sobre o bem, podendo persegui-lo e reivindicá-lo onde quer que este se encontre. Tal significa que poderá intentar uma acção executiva contra a sociedade devedora e o actual proprietário do bem para ser ressarcido através da venda do imóvel.
O caso em apreço abre, ainda, uma outra possibilidade. O facto da empresa se encontrar numa crise financeira, com o consequente incumprimento generalizado das suas obrigações, poderá ser fundamento para requerer a insolvência daquela. A opção por esta alternativa traz algumas vantagens, que a seguir se enumeram.
Em primeiro lugar, é concedido ao credor que requer a insolvência um privilégio creditório geral sobre todos os bens móveis integrantes da massa insolvente, relativo a um quarto do seu montante (artigo 98.º, n.º 1 do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas, doravante CIRE). Ou seja, um quarto do crédito reclamado adquire preferência no pagamento efectuado através do produto da venda dos bens móveis da insolvente.
Em segundo lugar, a declaração de insolvência determina a suspensão de todas as diligências executivas ou providências requeridas que atinjam bens da massa insolvente, como é o caso do arresto (artigo 88.º do CIRE).
Em terceiro lugar, os actos praticados pela insolvente, dentro dos quatro anos anteriores à data do início do processo de insolvência, que sejam prejudiciais à massa, podem ser resolvidos pelo Administrador de Insolvência. Ou seja, aqueles que diminuam, frustrem, dificultem, ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores da insolvência (artigo 120.º, n.º 2 do CIRE). In casu, a doação do imóvel a um sócio, constitui fundamento do pedido de resolução nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 121.º e n.º 3 do artigo 120.º do CIRE. Feita a resolução, o imóvel em causa volta a integrar a massa insolvente.
Por fim, enquanto credor com garantia real (hipoteca), o seu crédito é, em princípio, pago em primeiro lugar pelo produto da venda do bem onerado (artigo 174.º, n.º 1 do CIRE). Se o crédito não for integralmente pago, através da venda do imóvel hipotecado, este goza ainda do supra referido privilégio sobre o produto da venda dos bens móveis e, bem assim, da qualidade de crédito comum quanto ao remanescente.
Conclui-se, pois, que a opção pelo pedido de insolvência, caso se encontrem efectivamente verificados os pressupostos da sua declaração, parece ser a mais favorável para assegurar os interesses da empresa credora.
Daniela Moreira Martins
Gabinete de advogados António Vilar e Associados

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