sexta-feira, 17 de junho de 2011

Trabalho no estrangeiro


Somos uma empresa de construção civil e fomos contactados por um cliente nosso, francês, que pretende que executemos de uma obra em França, em regime de subempreitada. Para tal, pretendemos deslocar os nossos trabalhadores. Qual será o regime legal destes trabalhadores? Para além disso, porque a empresa francesa, empreiteira, não tem mão-de-obra suficiente para realizar a obra, perguntou-nos se lhes poderíamos ceder alguns trabalhadores. Podemos? Se sim, o que devemos fazer?

As questões que nos são colocadas, apesar se cingirem ao tema do envio de trabalhadores para França, abrangem várias realidades que devem ser distinguidas. Assim, por um lado, questiona-se qual o regime dos trabalhadores destacados para França por uma empresa portuguesa, no âmbito da realização de uma subempreitada. Por outro lado, porque a empreiteira francesa não tem capital humano suficiente, questiona se a empresa portuguesa lhe pode ceder alguns trabalhadores. Independentemente das respostas que iremos apresentar, importa sempre referir que, no caso em apreço, tanto a empresa portuguesa como, especialmente, a francesa poderão recorrer ao trabalho temporário como forma de obter os trabalhadores necessários. Vejamos, então, cada uma destas possibilidades:
i) O destacamento de trabalhadores: O destacamento de trabalhadores encontra-se previsto nos artigos 6º a 8º do Código do Trabalho (doravante CT) e consiste na deslocação temporária de trabalhadores contratados num Estado para outro Estado, a fim de aí exercerem a sua actividade. Assim, há destacamento de trabalhadores quando, no âmbito de uma prestação de serviços, a entidade empregadora desloca trabalhadores para um estabelecimento seu, ou para outra empresa, no estrangeiro. Independentemente da modalidade de destacamento adoptada, isto é, para um estabelecimento próprio ou de outra empresa, a relação de trabalho mantém-se com a empresa que o destaca. Alerte-se que, antes do início da prestação, o empregador deve transmitir uma declaração prévia de destacamento à direcção regional do trabalho do local onde se efectua a prestação, em língua francesa. Porque o contrato de trabalho se mantém intacto, durante o período em que o trabalhador se encontra destacado, cabe ao empregador o poder de direcção e disciplinar. Contudo, como o trabalhador poderá estar inserido no seio da organização de outra empresa, o empregador deve solicitar a colaboração desta, para lhe transmitir qualquer informação relevante quanto à prestação da actividade. A lei laboral não define os períodos de duração do destacamento de trabalhadores, mas, por força do § 1 do artigo 12º do Regulamento (CE) n.° 883/2004, o destacamento deverá ter uma duração máxima de 24 meses. No caso em apreço, nada impede que os trabalhadores portugueses sejam destacados para França para, ou no estabelecimento da empresa francesa, ou num estabelecimento próprio da empresa portuguesa, aí exercerem a sua actividade, no contexto de um contrato de subempreitada.
ii) A cedência ocasional de trabalhadores: A cedência ocasional de trabalhadores, prevista no artigo 288º e ss. do Código do Trabalho, consiste na disponibilização temporária de trabalhadores, pelo empregador, para prestar trabalho a outra entidade, a cujo poder de direcção aquele fica sujeito. A cedência será lícita quando estiverem preenchidos, cumulativamente, os requisitos previstos no artigo 289º CT e que aqui se elencam: O trabalhador esteja vinculado ao empregador cedente por contrato de trabalho sem termo resolutivo; A cedência se verificar no quadro da colaboração entre empresas jurídica ou financeiramente associadas ou economicamente interdependentes; O trabalhador aceite a cedência ocasional; O prazo de cedência não exceda um ano, renovável por períodos iguais até ao limite máximo de 5 anos. No caso em apreço, a cedência dos trabalhadores apenas será legal se estiverem preenchidos os requisitos acima mencionados, designadamente, se as sociedades envolvidas estiverem jurídica ou financeiramente associadas ou economicamente interdependentes. Nada impede que a empresa portuguesa constitua uma sucursal em França, para, então, ceder a esta os seus trabalhadores. A sucursal pode ser definida como um estabelecimento ou uma instalação fixa, sem personalidade jurídica própria, não localizada em território onde a casa-mãe possui a sua sede social e onde esta realiza a sua actividade.
iii) O trabalho temporário: A empresa francesa e, bem assim, a empresa portuguesa que irá trabalhar em França pode, ainda, “adquirir” a mão-de-obra que necessitam através da celebração de contratos de utilização de trabalho temporário. Note-se que tal só é possível através de uma empresa de trabalho temporário regularmente constituída e detentora de um alvará em vigor.
A contratação do trabalho temporário expressa-se numa relação triangular, que se consubstancia na celebração de dois contratos: o contrato de utilização e o contrato de trabalho temporário.
O contrato de utilização de trabalho temporário é um contrato de prestação de serviços a termo resolutivo, celebrado entre a empresa de trabalho temporário (ETT) e o utilizador, pelo qual a ETT se obriga, mediante retribuição, a ceder um ou mais trabalhadores temporários. Ao contrato de utilização aplica-se, salvo as especificidades previstas no Código do Trabalho (maxime artigo 175º a 179º), o regime obrigacional comum, nomeadamente no que diz respeito à estipulação da retribuição e à liberdade de cessação do contrato.
No caso vertente, através do contrato de utilização de trabalho temporário, tanto a empresa francesa como a empresa portuguesa a trabalhar em França poderão “receber” trabalhadores qualificados para realizar a tarefa em causa. Para tal, basta que se justifique o recurso a este tipo de contratação.
De acordo com o disposto no artigo 185º, nº 2 CT, durante o período em que se encontra cedido, o trabalhador temporário está sujeito ao regime de trabalho aplicável ao utilizador no que respeita ao modo, local, duração do trabalho, suspensão do contrato, segurança e saúde no trabalho e acesso a equipamentos sociais. Contudo, independentemente do local de trabalho do trabalhador temporário, o seu contrato de trabalho temporário rege-se pela lei laboral portuguesa, nomeadamente no que concerne ao direito à retribuição, a férias e aos demais subsídios.

Gabinete de Advogados António Vilar & Associados
Ricardo Meireles Vieira

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